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domingo, julho 12, 2015

SÃO BENTO - 11/07/2015


Como nos recordou Papa Bento XVI, São Bento fora declarado o patrono da Europa por Paulo VI e entre os ensinamentos de sua Regra, existia um que julgava de particular importância e atualidade, a saber, a centralidade na vida dos cristãos do amor à pessoa de Jesus Cristo, como Bento pede em sua Regra: “nada antepor ao amor de Cristo”.

Foi na véspera da própria Festa de São Bento no dia 11 de Julho, após a recitação do Ângelus, que novamente Bento XVI se referiu, agora com mais vagar, à sua predileção pela pessoa de São Bento, tendo em vista, sobretudo, as necessidades e crises do mundo atual. Por serem essas palavras pouco conhecidas, pensamos ser oportuno citar aqui, na íntegra, este testemunho pessoal do papa..
“Queridos irmãos e irmãs: Amanhã celebra-se a festa de São Bento abade, patrono da Europa, um santo pelo qual sinto um amor particular, como se pode intuir por ter elegido seu nome. Nascido em Núrsia, em torno ao ano 480, Bento realizou seus primeiros estudos em Roma, mas decepcionado pela vida da cidade, retirou-se a Subiaco, onde permaneceu durante uns três anos no famoso «Sacro Speco», dedicando-se totalmente a Deus. Em Subiaco, servindo-se das ruínas de uma grande vila do imperador Nero, junto a seus primeiros discípulos, construiu alguns mosteiros, dando vida a uma comunidade fraterna fundada na primazia do amor de Cristo, na qual a oração e o trabalho se alternam harmoniosamente em louvor a Deus.
 Anos depois, em Montecassino, deu plena forma a este projeto, e o pôs por escrito na «Regra», sua única obra que chegou até nós. Entre as cinzas do Império Romano, Bento, buscando antes que nada o Reino de Deus, semeou, talvez sem nem sequer dar-se conta, a semente de uma nova civilização que se desenvolveria, integrando os valores cristãos com a herança clássica, por uma parte e das culturas germânica e eslava por outra.

Há um aspecto típico de sua espiritualidade, que hoje quero sublinhar de maneira particular: Bento não fundou uma instituição monástica orientada principalmente à evangelização dos povos bárbaros, como os demais grandes monges missionários da época, mas indicou a seus seguidores como objetivo fundamental da existência, e mais, o único, a busca de Deus: «Quaerere Deum». Contudo, sabia que quando o crente entra em relação profunda com Deus não pode contentar-se em viver de maneira medíocre, com uma ética minimalista e uma religião superficial. 
Desde esta perspectiva, entende-se melhor a expressão que Bento tomou de São Cipriano e que, em sua «Regra» (IV, 21), sintetiza o programa de vida dos monges: «Nihil amori Christi praeponere», «Não antepor ao amor de Cristo». Nisto consiste a santidade, proposta válida para cada cristão, que se converteu em uma autêntica urgência pastoral em nossa época, na qual se experimenta a necessidade de ancorar a vida e a história em sólidas referências espirituais.”
Parece-nos igualmente importante e talvez ainda mais oportuno, conhecer outro pronunciamento, também recente, sobre a figura de Bento apresentado pelo ainda Cardeal Ratzinger, no final de uma Conferência pronunciada no Mosteiro de Subiaco, na ocasião em que recebeu o Prêmio “São Bento pela Europa”, que lhe fora concedido pela Fundação de Subiaco “Vida e Família”. Essa Conferência, com o seguinte título: “A Europa nas crises das culturas”, abordava as características principais das novas culturas que se manifestam nas correntes atuais do pensamento europeu.

 Essas culturas começam por negar, infelizmente, muitos dos principais valores da tradição da cultura cristã da Europa. No final dessa conferência o Cardeal Ratzinger se referia à importância, no momento atual, não somente dos trabalhos de grandes eruditos nas ciências modernas, mas, sobretudo, da necessidade da presença de verdadeiros mestres, que sejam testemunhas e que falem mais pela própria vida do que pelas idéias que apresentam. Neste momento Ratzinger voltava a referir-se a São Bento:
“Do que mais necessitamos, neste momento da história, é de homens que, através de uma fé iluminada e vivida, façam com que Deus seja credível neste mundo. 
O testemunho negativo de cristãos que falavam de Deus mas viviam contra Ele, obscureceu a imagem de Deus e abriu a porta para a incredulidade. Necessitamos, portanto, de homens que tenham o olhar fixo em Deus, abram o coração, de maneira que sua inteligência possa falar à inteligência dos outros e seu coração possa abrir o coração dos demais.
Somente através de homens que tenham sido como que “tomados por Deus”, Deus poderá voltar a estar presente entre os homens. 

Necessitamos de homens como Bento de Núrsia, que, em uma época de dissipação e decadência, penetrou na solidão mais profunda, conseguindo depois de todas as purificações que teve que sofrer, levantar-se até à luz, regressar e fundar Montecassino, a cidade sobre o monte que, entre tantas ruínas, reuniu as forças com que formou um mundo novo.
Deste modo Bento, como Abraão, chegou a ser pai de muitos povos. As recomendações a seus monges, apresentadas no final de sua “Regra” são indicações que nos mostram, também a nós, o caminho que conduz ao alto, a sair da crise e dos escombros. “Assim como há um mau zelo de amargor que separa de Deus e conduz ao inferno, há também um zelo bom que separa dos vícios e conduz a Deus e à vida eterna.

 Pratiquem pois os monges este zelo com a mais ardente caridade, isto é, “antecipem-se em honras uns aos outros”; tolerem-se com suma paciência suas fraquezas, tanto corporais como morais .... pratiquem castamente a caridade fraterna; temam a Deus com amor; ... e nada absolutamente anteponham a Cristo, que nos conduza todos juntos para a vida eterna” (RB 72).
Sim, Bento foi exemplo luminoso de santidade e indicou aos monges Cristo como único grande ideal; foi mestre de civilização que, propondo uma equilibrada e adequada visão das exigências divinas e das finalidades últimas do homem, teve sempre muito presentes também as necessidades e as razões do coração, para ensinar e suscitar uma fraternidade autêntica e constante, para que no conjunto dos relacionamentos sociais não se perdesse de vista uma unidade de espírito capaz de construir e alimentar sempre a paz.

Homilia do Papa Bento XVI na Celebração das Vésperas com os Abades Beneditinos e a Comunidade de Monges e Monjas, na Visita Pastoral a Cassino e a Montecassino (Domingo, Solenidade da Ascensão do Senhor, Basílica da Abadia de Montecassino, 24 de Maio de 2009)


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