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sábado, fevereiro 04, 2017

FESTA DA APRESENTAÇÃO DO SENHOR NO TEMPLO



Os primeiros versículos (22-24) do evangelho proclamado na liturgia de hoje tratam especificamente da manifestação (epifania) do messiado de Jesus a partir do cumprimento dos ritos de iniciação na religião da sua família, o judaísmo. Jesus e Maria, recém-nascido e parturiente, submeteram-se a tudo que a lei de Moisés indicava a respeito do nascimento de um menino primogênito (Lv 12,1-8; Ex 13,2.12-13).

Pela circuncisão (Lc 2,21), Jesus tinha sido oficialmente marcado como membro de Israel, ingressando na aliança feita com os patriarcas e com os descendentes deles desde Abraão até os escravos libertos do Egito. No momento da circuncisão, de acordo com a lei dada por Deus a Moisés, foi imposto o nome do menino: ele foi chamado Jesus, conforme o anjo havia orientado. Naquela cultura, o nome designava a identidade e a missão da pessoa. Jesus quer dizer “Deus salva”. Isso significa que Deus nunca desistiu de salvar o mundo por meio de Israel e que cumpriu essa promessa mediante um israelita fiel, Jesus de Nazaré. Ao se tornar oficialmente membro do povo da aliança, Jesus realizou em sua vida, morte e ressurreição a vocação que Abraão e seus descendentes haviam recebido.

Pelo rito de iniciação à religião judaica, ou seja, de pertença à antiga aliança, Jesus não somente deveria ser circuncidado, mas também resgatado. O primeiro rito remetia aos patriarcas e o segundo, à libertação do Egito. O ritual do resgate estava vinculado à Páscoa, quando os primogênitos dos hebreus tiveram a vida poupada e se tornaram consagrados a Deus (Ex 13,11-15; Nm 18,15-16). O resgate significava que o primogênito era trocado por uma quantia em dinheiro e, a partir de então, podia deixar o santuário e voltar ao convívio familiar.

Propositalmente, Lucas não menciona o resgate de Jesus, que, à semelhança dos levitas (Nm 3,45), continuará sempre pertencendo a Deus. Em vez do resgate do primogênito, Lucas narra a apresentação de Jesus, evocando a entrada do Senhor no santuário para realizar uma grande purificação (Ml 3,1-4). Ao dizer que o menino foi purificado, o evangelho está afirmando que Israel inteiro foi igualmente purificado por meio dele.

Aqui cabe um esclarecimento sobre o significado de purificação. Esse termo nem sempre denota algo negativo; nesse trecho do evangelho, a impureza não é moral, mas ritual (Lv 12,2-4) e significa apenas que, após aqueles ritos, as pessoas eram reinseridas na esfera da vida comunitária, de forma análoga a uma âmbula que, após ser purificada, deixa o sacrário e pode ser mantida junto com outros objetos.

A segunda parte do evangelho de hoje (vv. 25-40) fala sobre o reconhecimento do Cristo pelos representantes dos piedosos que esperavam a vinda do Messias, ou seja, a consolação de Israel, a qual, conforme Is 40,1, é sinônimo da salvação que vem de Deus. Os “pobres de Javé” reconhecem o Messias libertador naquele frágil recém-nascido.

Primeiramente, aparece Simeão. Seu hino de louvor é também um discurso de despedida, como acontece no livro do Deuteronômio, que fecha o Pentateuco (Torah) com longa despedida de Moisés. O velho Simeão reconhece que a esperança de Israel converge para aquele menino, o qual realizará a libertação de Jerusalém, a cidade santa, que no Antigo Testamento representa todos os escolhidos de Deus. Além disso, o menino é uma luz que parte de Israel para as nações pagãs e será um sinal de contradição, pois diante dele todos terão de tomar uma decisão. Nesse sentido, ele será soerguimento para alguns e queda para outros, pois diante dele se revelarão as intenções dos corações.

Em seguida, Ana é mencionada. O nome dela significa “graça”, “favor”. Ao fazer referência à família de Ana como pertencente ao clã de Fanuel, Lucas alude a uma experiência mística do patriarca Jacó e a todos aqueles que sempre desejaram ver Deus face a face (Gn 32,30). Também a menção à tribo de Ana é algo bastante significativo, porque, no antigo Israel, a tribo de Aser ficava ao norte (Js 17,10); isso mostra que Ana era uma profetisa da Galileia e, portanto, seria considerada pelos legalistas de Jerusalém como suspeita de heresia. No entanto, é ela, e não os líderes religiosos da época, quem reconhece Jesus como Messias.