Páginas

segunda-feira, fevereiro 19, 2018

I DOMINGO DA QUARESMA



A violência nas entrelinhas da Palavra   

A reflexão quaresmal deste ano de 2018, a pedido dos Bispos do Brasil, insere-se no contexto da violência humana, proposto na Campanha da Fraternidade deste ano, que tem como tema: "Fraternidade e superação da violência". A 1ª leitura apresenta o final de uma história de violência, diante da qual Deus promete que não mais destruiria a terra e nem a humanidade. O dilúvio foi uma consequência de causas violentas, descritas antes da leitura que ouvimos, como lutas fratricidas entre Caim e Abel, como a vingança de Lamec, como a degradação moral que tomou conta da humanidade e outras violências descritas, como dito, antes da leitura que ouvimos. A Bíblia diz que quando Deus conclui a criação a contemplou e viu que tudo era bom. Ora, aquele mundo criado "bom" por Deus corrompeu-se pela violência física e moral. O efeito da violência é a morte, é a corrupção da vida humana. A violência é sempre destrutiva e destruidora.

O símbolo do dilúvio    

Por isso, vale colocar aqui uma pergunta: o dilúvio foi um castigo divino ou foi consequência da violência do pecado? Atualmente, existe muita discussão se houve ou não houve dilúvio. Não vamos entrar nessa discussão, porque o dilúvio, mais que um fato histórico é um fato simbólico que representa o resultado da violência humana provocada contra a natureza, contra a sociedade e de pessoa contra pessoa. Por isso, considerando o resultado da violência no simbolismo destruidor do dilúvio, somos chamados a compreender que o caminho da violência é a destruição da terra e da humanidade. Hoje, não falamos de dilúvio, mas de armas nucleares com poder de destruir a terra e acabar com toda a humanidade. Para que? O que se quer com isso? Eu só tenho uma resposta: demonstrar como o pecado da arrogância é capaz de destruir famílias, povos e toda a terra. O símbolo violento do dilúvio hoje se chama armas nucleares, por exemplo.

Não cair na tentação da violência    

Jesus está no deserto, onde é tentado por Satanás. Isso me faz lembrar que Jesus ensina, na oração do Pai nosso, a suplicar a graça de não cair em tentação e, logo em seguida, conclui com o pedido para ser libertado do mal: "não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal". Tentação e maldade são vizinhas, por isso, é preciso ter cuidado, porque a tentação, no contexto espiritual cristão, tem conotação de violência ligada ao pecado. É a violência do pecado que conduz ao mal, que atinge a vida humana e que a aprisiona; torna a vida prisioneira da violência. Por isso, a súplica de Jesus para ser libertado da tentação e do mal. Da tentação de pensar que com a força da violência se consegue mudar as coisas. O caminho da mudança não passa pela violência do pecado e jamais passará, porque este destrói. O caminho da mudança passa pela ternura, pela compaixão, pela misericórdia, como cantávamos no salmo responsorial.

 Deserto e paraíso     

Vou concluir chamando atenção para o Evangelho que ouvimos. São Marcos não apresenta as três tentações de Jesus, como fazem Mateus e Lucas. Diz apenas que Jesus estava no deserto e foi tentado. Mas, tem outro detalhe: Marcos apresenta dois cenários quando diz que Jesus convivia com animais selvagens e os anjos o serviam. O cenário da tentação e o cenário da convivência com animais selvagens e com anjos. Esta é a imagem do paraíso, quando Adão e Eva conviviam harmoniosamente com a natureza, apesar da tentação. Esta é também a realidade da nossa vida: o deserto da tentação e o paraíso de anjos que nos servem. A Palavra coloca diante de nós esta escolha. Você pode escolher cair em tentação e entrar no pecado que sempre promove a destruição pela violência, ou, você pode viver no paraíso, onde se convive com animais selvagens, com gente grossa, com agressividades, mas se é servido por anjos, quer dizer, a presença divina em nós que nos serve e produz paz interior, produz força para não cair na tentação. Para isso, valerá a pena repetir todos os dias desta 1ª semana da Quaresma o refrão do salmo responsorial: "verdade e amor são os caminhos do Senhor". A superação da violência acontece em quem caminha nos caminhos do Senhor. Amém!