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sábado, março 23, 2019

VIA SACRA CRECHE TIA MAURA, PEDRA BONITA


De Caifás, levaram Jesus à sede do governador romano. Era de manhã cedo e eles não entraram no edifício para não se contaminarem e poderem celebrar a Páscoa. Pilatos veio ter com eles cá fora e perguntou-lhes: "Que acusações apresentais contra este homem?" Responderam-lhe: "Se Ele não fosse um malfeitor, não to entregaríamos." Retorquiu-lhes Pilatos: "Tomai-o vós e julgai-o segundo a vossa Lei". "Não nos está permitido dar a morte a ninguém", disseram-lhe os judeus, em cumprimento do que Jesus tinha dito, quando explicou de que espécie de morte havia de morrer. Pilatos entrou de novo no edifício da sede, chamou Jesus e perguntou-lhe: "Tu és rei dos judeus?"
 Como Pilatos, também nós somos obrigados a confrontar-nos pessoalmente com Jesus. Pilatos continua a sair e a entrar no pretório. Com esta imagem, João quer transmitir-nos uma mensagem: para o crente tomar partido diante da verdade de Jesus implica o confronto com o exterior e empenha-o no seu modo de estar no mundo e na forma com que vive as suas responsabilidades na sociedade.
Pilatos deve decidir se colocar-se diante de Jesus só por curiosidade, ou, se pelo contrário, deve colocar-se perante Ele segundo a verdade. Com isto, Jesus também nos convida implicitamente porque, meditando na mensagem evangélica, estamos dispostos a colocar-nos em discussão e a olhar com liberdade e sinceridade a grande questão da verdade, que coincide com a do sentido da vida em si mesma.




Pilatos entrou de novo no edifício da sede, chamou Jesus e perguntou-lhe: "Tu és rei dos judeus?" Respondeu-lhe Jesus: "Tu perguntas isso por ti mesmo, ou porque outros to disseram de mim?" Pilatos replicou: "Serei eu judeu, porventura? A tua gente e os sumos sacerdotes é que te entregaram a mim! Que fizeste?" Jesus respondeu: "A minha realeza não é deste mundo; se a minha realeza fosse deste mundo, os meus guardas teriam lutado para que Eu não fosse entregue às autoridades judaicas; portanto, o meu reino não é de cá." Disse-lhe Pilatos: "Logo, Tu és rei!" Respondeu-lhe Jesus: "É como dizes: Eu sou rei! Para isto nasci, para isto vim ao mundo: para dar testemunho da Verdade. Todo aquele que vive da Verdade escuta a minha voz." Pilatos replicou-lhe: "Que é a verdade?" Dito isto, foi ter de novo com os judeus e disse-lhes: "Não vejo nele nenhum crime. Mas é costume eu libertar-vos um preso na Páscoa. Quereis que vos solte o rei dos judeus?" Eles puseram-se de novo a gritar, dizendo: "Este não, mas sim Barrabás!" E Barrabás era um salteador.

– Continua o diálogo entre Jesus e Pilatos. A discussão dirige-se agora para o tema da autêntica missão de um rei. A incompreensão de Pilatos frente a uma majestade que recusa o exercício da, força é total. Isto permite a Jesus completar a revelação sobre a própria realeza. A sua função de rei não consiste em dominar ou governar, mas em dar testemunho da verdade. A ‘verdade’ em sentido bíblico é revelação, é manifestação. Se a verdade de Deus no Antigo Testamento era a fidelidade às suas promessas e à solidez da aliança, em João adquire um sentido superior: é a revelação do amor de Deus pelo mundo
, revelação que se realiza através do Filho (Jo 1, 18). É o próprio Jesus, com as suas palavras e sobretudo com a sua vida e morte, a constituir a Verdade sobre Deus e a manifestação da fidelidade de Deus ao homem.




Então, Pilatos mandou levar Jesus e flagelá-lo. Depois, os soldados entrelaçaram uma coroa de espinhos e cravaram-lha na cabeça, e cobriram-no com um manto de púrpura, e, aproximando-se dele, diziam-lhe: "Salve, ó rei dos judeus!" E davam-lhe bofetadas. Pilatos saiu de novo e disse-lhes: "Vou trazê-lo cá fora para saberdes que eu não vejo nele nenhuma causa de condenação." Então, saiu Jesus com a coroa de espinhos e o manto de púrpura. Disse-lhes Pilatos: "Eis o Homem!" Assim que viram Jesus, os sumos sacerdotes e os seus servidores gritaram: "Crucifica-o! Crucifica-o!" Disse-lhes Pilatos: "Levai-o vós e crucificai-o. Eu não descubro nele nenhum crime." Os judeus replicaram-lhe: "Nós temos uma Lei, e segundo essa Lei deve morrer, porque disse ser Filho de Deus." Quando Pilatos ouviu estas palavras, mais assustado ficou. Voltou a entrar no edifício da sede e perguntou a Jesus: "Donde és Tu?" Mas Jesus não lhe deu resposta. Pilatos disse-lhe, então: "Não me dizes nada? Não sabes que tenho poder de te libertar e o poder de te crucificar?" Respondeu-lhe Jesus: "Não terias nenhum poder sobre mim, se não te fosse dado do Alto. Por isso, quem me entregou a ti tem maior pecado."
A segunda parte do colóquio entre Jesus e Pilatos é precedida pela cena da flagelação e coroação de espinhos e pela célebre passagem do ‘Ecce homo’. A coroação de espinhos, pela sua brevidade, é o episódio central da narração de João no processo. Os soldados vestem Jesus de imperador romano, para gozarem dele. Mas se aos soldados escapa o verdadeiro sentido da cena, os olhos da fé olham como Jesus fundamenta a sua realeza na Paixão, o dom perfeito em si, na obediência total ao Pai e no amor para com todos os homens. No ‘Ecce homo’, mesmo que Pilatos escarneça de Jesus e exiba a incapacidade humana de compreender o reino que Jesus veio estabelecer, contemplamos a imagem da verdade divina sobre o homem e descobrimos n’Ele o cumprimento do sonho de Deus que criou o homem à sua "imagem e semelhança".



 A partir daí, Pilatos procurava libertá-lo, mas os judeus clamavam: "Se libertas este homem, não és amigo de César! Todo aquele que se faz rei declara-se contra César." Ouvindo estas palavras, Pilatos trouxe Jesus para fora e fê-lo sentar numa tribuna, no lugar chamado Lajedo, ou Gabatá em hebraico. Era a Véspera da Páscoa, por volta do meio-dia. Disse, então, aos judeus: "Aqui está o vosso Rei!" E eles bradaram: "Fora, fora! Crucifica-o!" Diz-lhes Pilatos: "Então, hei-de crucificar o vosso Rei?" Replicaram os sumos sacerdotes: "Não temos outro rei, senão César." Então, entregou-o para ser crucificado. E eles tomaram conta de Jesus.
Tanto os judeus como Pilatos declaram enganosos os dois sistemas de poder que incarnam: Pilatos subtrai-se à autoridade civil que o acredita, para se colocar à disposição dos acusadores de Jesus; estes renunciam à autoridade da sua Lei para se colocarem sobre a autoridade de Roma. É uma mudança na qual já não se entende mais quem governa ou é governado. A última cena vivida fora do pretório é a mais impressionante. A hora é muito importante – é o momento da luz plena, é meio dia: agora manifesta-se a glória do Juiz, mesmo que paradoxalmente seja ele o julgado! Os soldados tinham feito a investidura real de Jesus, agora Pilatos entronizava-o diante do seu povo como rei (depois no Gólgota será feita proclamação universal da sua realeza). Realiza-se aqui a nível simbólico o sentido fundamental da crucifixão e da ressurreição: a exaltação do Rei-Messias – rei espoliado de atributos de poder, mas deslumbrante na luz do amor – e a condenação do mundo pecador.