É difícil
fazer calar uma multidão. Na descida do monte das Oliveiras, a multidão de
Jerusalém aclama Jesus: “Bendito o que vem, o nosso rei, em nome do Senhor!”
Mas uma multidão pode ser manipulada e acabar por dizer o contrário. Assim,
alguns dias mais tarde, ela gritará: “Morte a este homem! Crucifica-o!” Jesus
não quer calar a multidão que O aclama, porque, se eles se calam, as pedras
falarão! Será um malfeitor, crucificado junto d’Ele, que O reconhecerá como
rei: “Jesus, lembra-Te de mim, quando vieres com a tua realeza”. Será um
centurião, um pagão do exército romano, a fazer um ato de fé: “Realmente este
homem era justo!” As pedras não terão necessidade de gritar, porque estes dois
homens recusaram calar-se: já o Espírito os animava e fazia-lhes dizer a
verdade. Quanto a Jesus, é por ter dito a verdade que é levado à morte. De fato,
a verdade desarranja… O trono que espera este rei é a cruz e a sua coroa será
de espinhos: na fraqueza manifestar-se-á o poder de Deus, o poder do Amor!
São Lucas é “o escriba da misericórdia de Deus”. De fato, mesmo no relato
da Paixão, sem esquecer os sofrimentos de Jesus, em particular a sua angústia
na agonia do monte das Oliveiras, Lucas continua a revelar até ao fim a
misericórdia do Pai. Ele guardou memória de três palavras de Jesus. Primeira
palavra de Jesus: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Jesus não
se limita a perdoar, vai mais longe. Ele sabe que a fonte de todo o amor e de
todo o perdão não está n’Ele, mas no Pai. Ele apresenta-Se diante do Pai como o
intercessor a quem o Pai nada pode recusar. Ele apaga-Se, para que vejamos que
é a vontade do Pai que se está a cumprir. É a oração de sempre de Jesus por
nós, Ele que está sempre vivo para interceder em nosso favor. Segunda palavra
de Jesus, que é a resposta ao “bom ladrão”: “Em verdade te digo: hoje estarás
comigo no Paraíso”. A eficácia do perdão que o Pai dá por Jesus não suporta
qualquer adiamento. Jesus apaga definitivamente a imagem de um Deus terrível e
vingador, que nada deixa passar. Cremos num Deus Pai que perdoa “setenta vezes
sete”. Terceira palavra de Jesus, que é um grito de uma infinita confiança no
seu Pai: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”. Jesus acolheu sempre, na
liberdade da sua consciência humana, o amor que Lhe dava o seu Pai. Sempre
esteve nas mãos do Pai. Mesmo na sua última palavra, Jesus manifesta a sua
adesão a este amor infinito do seu Pai, à sua vontade de salvação, de
misericórdia, para além de tudo o que possamos imaginar.