A
“voz”, através da qual Deus fala, convida-nos a endireitar “o caminho do
Senhor”. Na linguagem do Evangelho segundo João, é um convite a deixar “as
trevas” e a nascer para “a luz”. Implica, na vida prática, abandonar a mentira,
os comportamentos egoístas, as atitudes injustas, os gestos de violência, os
preconceitos, o comodismo, a autossuficiência, tudo o que desfigura a nossa vida, nos torna escravos e nos impede
de chegar à verdadeira felicidade. Em termos pessoais, quais são as mudanças
que eu tenho de operar na minha existência para passar das “trevas” para a
“luz”? O que é que me escraviza e me impede de ser plenamente feliz? O que é
que em mim gera desilusão, frustração, desencanto, sofrimento?
A
“voz”, através da qual Deus fala, convida-nos a olhar para Jesus, pois só Ele é
“a luz” e só Ele tem uma proposta de vida verdadeira para nos apresentar. À
nossa volta abundam os “vendedores de sonhos”, com propostas de felicidade
“absolutamente garantida”. Atraem-nos, seduzem-nos, manipulam-nos,
escravizam-nos e, quase sempre, deixam-nos decepcionados e infelizes, mais
angustiados, mais perdidos, mais frustrados. João garante-nos: só Jesus é “a
luz” que liberta os homens da escravidão e das trevas e lhes oferece a vida
verdadeira e definitiva. A quem dou ouvidos: às propostas de Jesus, ou às
propostas da moda, do politicamente correto, das pessoas “in” que aparecem dia
a dia nas colunas e nas redes sociais e que ditam o que está certo e está
errado à luz dos critérios do mundo? Que significado é que Jesus e a sua
proposta assumem no meu dia a dia?
Jesus
marca realmente a minha existência? Os valores que Ele veio propor têm peso e
impacto nas minhas decisões e opções? Quando celebro o nascimento de Jesus,
celebro um acontecimento do passado que deixou a sua marca na história, ou
celebro o encontro com alguém que é “a luz” que ilumina a minha existência e
que enche a minha vida de paz, de alegria, de liberdade?
O
“homem chamado João”, enviado por Deus “para dar testemunho da luz”,
convida-nos a pensar sobre a forma de Deus atuar na história humana e sobre as
responsabilidades que Deus nos atribui na recriação do mundo… Deus não utiliza
métodos espetaculares e assombrosos para intervir na nossa história e para
recriar o mundo; mas Ele vem ao encontro dos homens e do mundo para os envolver
no seu amor através de pessoas concretas, com um nome e uma história, pessoas
“normais” a quem Deus chama e a quem confia determinada missão. A todos nós,
seus filhos, Deus confia uma missão no mundo, a missão de dar testemunho da
“luz” e de tornar presente, para os nossos irmãos, a proposta libertadora de
Jesus. Tenho consciência de que Deus me chama e me envia ao mundo? Como é que
eu respondo ao chamamento de Deus: com disponibilidade e entrega, ou com
preguiça, comodismo e instalação?
A
atitude simples e discreta com que João se apresenta é muito sugestiva: ele não
procura atrair sobre si as atenções, não usa a missão para a sua glória ou
promoção pessoal, não busca a satisfação de interesses egoístas; ele é apenas
uma “voz” anônima e discreta que recorda, na sombra, as realidades importantes.
João é uma tremenda interpelação para todos aqueles a quem Deus chama e envia…
Com ele, o profeta – isto é, todo aquele a quem Deus chama e a quem confia uma
missão – deve aprender a ficar na sombra, a ser discreto e simples.
A
atitude dos fariseus e dos líderes judaicos – cheios de preconceitos,
preocupados em manter os seus esquemas de poder e instalação, acomodados nos
seus privilégios – impede-os de conhecer “a luz” que está a chegar. Trata-se de
um aviso, para nós: quando nos instalamos no nosso comodismo, no nosso
bem-estar, na nossa autossuficiência, fechamos o coração à novidade e aos
desafios que Deus nos faz. Dessa forma, não reconhecemos Jesus quando Ele vem
ao nosso encontro e não O deixamos entrar na nossa vida. A Palavra neste tempo
de Advento convida-nos à desinstalação, a fim de que o Senhor que vem possa
nascer e permanecer na nossa vida.