O papa Francisco viajou neste sábado (6) a Sarajevo em uma visita relâmpago destinada a promover a convivência dos povos e das diferentes religiões na Bósnia, vinte anos depois do fim da guerra.
Maioritariamente muçulmana, a capital bósnia foi o palco do conflito que, entre 1992 e 1995, fez 100 mil mortos. Sarajevo recebeu a visita do papa João Paulo II em abril de 1997, que, com a saúde já muito fragilizada, pregou o perdão e a reconciliação.
Diante de 65.000 fiéis reunidos no estádio olímpico da cidade, o pontífice afirmou sentir um "clima de guerra" no mundo, estimulado "deliberadamente" por aqueles que "buscam o confronto entre as distintas culturas e civilizações".
"Sarajevo e a Bósnia têm um significado especial para a Europa e para o mundo inteiro", disse o papa argentino um pouco antes de chegar à capital bósnia, onde foi recebido por 100.000 pessoas. "Fazer a paz é um trabalho artesanal: requer paixão, paciência, experiência, afinco. Fazer a paz é um trabalho que se realiza a cada dia, passo a passo, sem cansar jamais", afirmou aos fiéis.
Com esta viagem a um país balcânico da "periferia" da Europa, o pontífice argentino reafirma seu compromisso com a coexistência de povos e religiões, após a visita há oito meses à Albânia.
A coexistência de três comunidades de confissões diferentes "mostra ao mundo inteiro que a colaboração entre distintas etnias e religiões para o bem comum é possível".
"Mas particularmente aqui, na Bósnia, é preciso fazer mais", completou, olhando para o presidente bósnio em exercício, Mladen Ivanic.
O poder tanto na Albânia quanto na Bósnia está dividido entre representantes com tradições religiosas diferentes.
A Bósnia, país de 3,8 milhões de habitantes, é composta por duas entidades: a República Srpska, com maioria de sérvios (cristãos ortodoxos), e a federação croata-muçulmana, na qual os muçulmanos superam em número os croatas católicos.
A presidência bósnia é ocupada de maneira alternada a cada oito meses entre um representante sérvio, um muçulmano e um croata.
VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO A SARAJEVO (BÓSNIA-HERZEGÓVINA) - Estádio Koševo de Sarajevo - Sábado, 6 de Junho de 2015
Amados irmãos e irmãs!
Nas leituras bíblicas que ouvimos, ressoou várias vezes a palavra «paz». Palavra profética por excelência! Paz é o sonho de Deus, é o projeto de Deus para a humanidade, para a história, com toda a criação. E é um projeto que encontra sempre oposição por parte do homem e por parte do maligno. Também no nosso tempo, a aspiração pela paz e o compromisso de a construir colidem com o facto dos numerosos conflitos armados existentes no mundo. É uma espécie de terceira guerra mundial travada «aos pedaços»; e, no contexto da comunicação global, sente-se um clima de guerra.
Há quem queira deliberadamente criar e fomentar este clima, de modo particular aqueles que procuram o conflito entre culturas e civilizações diferentes e também quantos, para vender armas, especulam sobre as guerras. Mas a guerra significa crianças, mulheres e idosos nos campos de refugiados; significa deslocamentos forçados; significa casas, estradas, fábricas destruídas; significa sobretudo tantas vidas destroçadas. Bem o sabeis vós, que experimentastes isto mesmo precisamente aqui: quanto sofrimento, quanta destruição, quanta tribulação! Hoje, amados irmãos e irmãs, desta cidade ergue-se mais uma vez o grito do povo de Deus e de todos os homens e mulheres de boa vontade: Nunca mais a guerra!
Dentro deste clima de guerra salienta-se, como um raio de sol que atravessa as nuvens, a palavra de Jesus no Evangelho: «Felizes os pacificadores» (Mt 5, 9). Trata-se dum apelo sempre atual, que vale para cada geração. Jesus não diz «Felizes os pregadores de paz»: todos são capazes de a proclamar, até de maneira hipócrita ou mesmo enganadora. Não. Ele diz: «Felizes os pacificadores», isto é, aqueles que a fazem. Fazer a paz é um trabalho artesanal: requer paixão, paciência, experiência, tenacidade.
Encontro com os sacerdotes, religiosas, religiosos e seminaristas na Catedral. |
E como se faz, como se constrói a paz? Recordou-no-lo, de forma essencial, o profeta Isaías: «A paz será obra da justiça» (32, 17). A frase «opus iustitiae pax» – segundo a versão da «Vulgata» – tornou-se um lema célebre, profeticamente adoptado pelo próprio Papa Pio XII. A paz é obra da justiça. Também aqui falamos, não duma justiça declamada, teorizada, planificada, mas da justiça praticada, vivida.
E o Novo Testamento ensina-nos que o pleno cumprimento da justiça é amar o próximo como a nós mesmos (cf. Mt 22, 39; Rom 13, 9). Quando, ajudados pela graça de Deus, seguimos este mandamento, como mudam as coisas! Porque mudamos nós! Aquela pessoa, aquele povo que eu via como inimigo, na realidade tem o meu próprio rosto, o meu próprio coração, a minha própria alma. Temos o mesmo Pai nos Céus. Então a verdadeira justiça é fazer àquela pessoa, àquele povo, o mesmo que eu queria que fosse feito a mim, ao meu povo (cf. Mt 7, 12).
E o Novo Testamento ensina-nos que o pleno cumprimento da justiça é amar o próximo como a nós mesmos (cf. Mt 22, 39; Rom 13, 9). Quando, ajudados pela graça de Deus, seguimos este mandamento, como mudam as coisas! Porque mudamos nós! Aquela pessoa, aquele povo que eu via como inimigo, na realidade tem o meu próprio rosto, o meu próprio coração, a minha própria alma. Temos o mesmo Pai nos Céus. Então a verdadeira justiça é fazer àquela pessoa, àquele povo, o mesmo que eu queria que fosse feito a mim, ao meu povo (cf. Mt 7, 12).
São Paulo, na segunda Leitura, indicou-nos as atitudes necessárias para fazer a paz: «Revesti-vos de sentimentos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de paciência, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente, se alguém tiver razão de queixa contra outro. Tal como o Senhor vos perdoou, fazei-o vós também» (Col 3, 12-13).
Eis aqui as atitudes para ser «artesãos» de paz no dia a dia, onde quer que vivamos. Não nos iludamos, porém, de que isto dependa só de nós; cairíamos num moralismo ilusório.
Amados irmãos e irmãs, hoje peçamos juntos ao Senhor, por intercessão da Virgem Maria, a graça de ter um coração simples, a graça da paciência, a graça de lutar e trabalhar pela justiça, de ser misericordiosos, de trabalhar pela paz, de semear a paz e não guerra e discórdia. Este é o caminho que torna felizes, que torna bem-aventurados.
Service L'Osservatore Romano
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