O diálogo entre Deus, o homem e a
mulher
Depois
do pecado, Deus interroga Adão: "onde estás?" (1L). Deus interroga o
homem e a mulher porque são capazes de entrar em diálogo com ele. Mas, Deus não
conversa com a serpente porque, enquanto símbolo do mal, não é digna e nem
capaz de entrar em contato com Deus. Entre Deus e o mal, entre Deus e a maldade
(pecado), existe total incompatibilidade. Um modo para entender que Deus não é
responsável pelo mal e nem responsável pelo pecado.
Deus
interroga o homem e lhe pergunta: "onde estás?" (1L). Não o interroga
perguntando o que fez. Não interroga para ter informações, mas para oferecer ao
homem a possibilidade de perceber onde ele se situa no diálogo: está dialogando
com Deus ou dialogando com a serpente? (1L). Está em contato com Deus ou em
contato com a serpente? Com quem o homem e a mulher estão em contato na sua
vida?
Interessante
perceber que Adão não se reconhece como autor do pecado. Transfere a
responsabilidade, inicialmente a Eva e, depois, transfere a responsabilidade ao
próprio Deus: "a mulher que me destes por companheira" (1L). Segundo
o raciocínio de Adão, se Deus não tivesse criado a mulher, ele não teria
pecado. De igual maneira, a mulher culpa a serpente. Quando se está em contato
com o mal é difícil admitir o erro.
Punição terapêutica
O
que acontece como punição, no relato da 1ª leitura, não se entenda como
castigo, mas como atitude terapêutica da parte de Deus, depois de Adão e Eva
aceitarem a promessa maldosa de que seriam como Deus (1L). Aquilo que se
configura como punição de ser expulso do paraíso é, na realidade, uma atividade
terapêutica, da parte de Deus, que consiste em ajudar Adão e Eva a perceber que
se Deus cuida da criação sem fadiga alguma, o homem experimenta a fadiga do
trabalho para transformar a terra e dela se alimentar. Se Deus não sofre para
gerar a vida, a mulher passa pelas dores de parto. Fadiga no trabalho e dores
de parto fazem compreender que não são iguais a Deus; são criaturas de Deus.
Neste
processo terapêutico, Deus não abandona o homem e a mulher, mas coloca-se ao
lado deles fortalecendo-os para combater o mal que está neles e fora deles. O
êxito da luta, a vitória final, está na promessa divina de que a mulher
esmagará a cabeça da serpente (1L) que, na teologia paulina, abre a
possibilidade de ser admitido a participar da santidade divina, no amor (2L),
cujo ponto alto desta santidade se faz presente na vida da Imaculada Conceição
da Virgem Maria.
Maria
e a fé
O
Evangelho desta Solenidade proclama a cena da Anunciação. É o Evangelho da
vocação de Maria em vista do projeto divino: "eis que conceberás e darás à
luz, um filho, a quem porás o nome de Jesus" (E).
Diante
do anúncio do anjo, "Maria ficou perturbada" (E). Não é uma
experiência de medo, mas da consciência de estar diante de Deus e participando
da transcendência divina. Chama atenção o fato de Maria não ficar calada, mas
entrar em contato com o mensageiro divino para compreender sua vocação.
A
resposta do anjo, como nas narrativas Bíblicas vocacionais, incentiva Maria a
aderir ao chamado divino pela fé, manifestada por sinais. No caso de Maria, o
sinal é outra gravidez: "também Isabel, tua parenta, concebeu um filho na
velhice" (E). Diante do modo misterioso da concepção virginal de Maria, o
anjo proclama o sinal da gravidez na velhice "porque para Deus nada é
impossível" (E). Maria responde com a disposição de se fazer serva do
Senhor (E). Assim, em Maria, a nova Eva, Deus recria uma humanidade nova, capaz
de dialogar com Deus, cujo fruto do ventre imaculado é Jesus Cristo (2L), o
homem novo, que não conversa com o mal, mas acolhe totalmente viver fazendo a
vontade divina.