A
liturgia deste domingo tem seu ápice na leitura da narrativa da paixão do
Senhor (cf. Mc 14,1-15,47). Para muitos
cristãos é a única ocasião que têm para ouvir, no decurso de uma assembleia
litúrgica, esta parte do Evangelho. A
celebração se abre com o “Hosana!” E culmina com o “Crucifica-o!” Mas o texto evangélico nos convida a
contemplar a paixão e morte de Jesus: É o momento supremo de uma vida feita a
serviço do homem. O relato do
Evangelista São Marcos está fundamentado em acontecimentos concretos e
apresenta Jesus como o Filho de Deus que aceita cumprir o projeto do Pai, mesmo
quando esse projeto passa por um destino de cruz.
Pode-se
destacar ainda no relato da paixão apresentado por São Marcos, o interrogatório
ao qual Jesus é submetido no palácio do sumo sacerdote. Em um certo momento
Jesus não hesita em esclarecer os fatos e em deixar clara a sua divindade.
Quando o Sumo sacerdote perguntou a Jesus diretamente se Ele era “o Messias, o
Filho de Deus bendito” (Mc 14,61), Jesus responde imediatamente: “Eu sou. E
vereis o Filho do Homem sentado à direita do Todo poderoso vir sobre as nuvens
do céu” (Mc 14,62). A expressão “eu sou” (egô eimi) nos leva ao nome de Deus no
Antigo Testamento: “Eu sou aquele que sou” (Ex 3,14). Na perspectiva do evangelista São Marcos,
esta é a afirmação que confirma a divindade de Jesus. A referência ao “sentar-se
à direita do Todo poderoso” e ao “vir sobre as nuvens” sublinha, também, a
dignidade divina de Jesus, que um dia aparecerá como juiz soberano da
humanidade inteira. O sumo sacerdote percebe perfeitamente o alcance da
afirmação de Jesus, o que o faz manifestar a sua indignação rasgando as vestes
e condenando Jesus como blasfemo.
O
centurião romano, junto da cruz de Jesus, confirma: “Na verdade, este homem era
Filho de Deus” (Mc 15,39). Mais do que uma afirmação histórica, esta frase deve
ser vista como uma “profissão de fé” que o Evangelista São Marcos nos convida a
fazer. Depois de tudo o que foi testemunhado ao longo do Evangelho em geral, e
no relato da paixão, a conclusão é óbvia: Jesus é mesmo o Filho de Deus que
veio ao encontro da humanidade para lhe apresentar uma proposta de salvação.
Ao
perceber a morte próxima, Jesus faz uma oração dizendo: “Meu Deus, meu Deus,
por que me abandonastes?” (Mc 15,34). Esta oração de Jesus indica que a sua
natureza humana se une a cada um de nós.
Como qualquer outro ser humano, Jesus também experimenta a solidão, o
abandono, o sentimento de impotência, a sensação de fracasso. No âmago do seu
drama, Jesus sente que foi abandonado por Deus. Mas, com isto, parece se
solidarizar com cada homem que sofre e experimenta a fragilidade, o drama e a
debilidade que a vida pode oferecer. Em todos os relatos da paixão, Jesus
aparece a enfrentar sozinho este abandono.
São Marcos sublinha a solidão de Jesus, nesses momentos dramáticos.
Abandonado
pelos discípulos, escarnecido pela multidão, condenado pelos líderes, torturado
pelos soldados, Jesus percorre na solidão e indiferença de todos, o seu caminho
de morte. Contudo, podemos frisar que
apesar destes relatos, sublinhando como Jesus se comporta ao longo de todo o
processo que conduz à sua morte, nota-se que ele nunca se descontrola, nunca
recua, nunca resiste, mas está sempre sereno e digno, enfrentando o seu destino
de cruz. A atitude de Jesus é a atitude de quem sabe e está decidido a cumprir
a missão que o Pai lhe confiou.
Possamos
nestes dias da Semana Santa estar unidos à Virgem Maria no Monte Calvário,
permanecendo ela aos pés da Cruz, velando com ela o Cristo morto, aguardando
também com ela o dia luminoso da ressurreição.
Que ela interceda por nós e nos faça direcionar os nossos passos no
caminho da verdade e do bem. Assim seja.