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terça-feira, dezembro 28, 2021

DOMINGO DA SAGRADA FAMÍLIA






O Evangelho relata a perda e o encontro do Menino Jesus no Templo. Um tema que, dado a distância histórica, parece ter-nos acostumados a não avaliar os sentimentos dos pais de Jesus, José e Maria. Pais que sofreram angustiados quando perceberam que Jesus não estava na comitiva de retorno à sua casa. Jesus foi encontrado no templo. Estava perdido no espaço do templo, no espaço sagrado onde o povo encontra-se com Deus, no espaço onde Deus é invocado pelo povo e pelas famílias. Filho perdido nos faz remeter à tristeza angustiada de filhos  perdidos em templos que não são de Deus. Filhos, adolescentes e filhos jovens perdidos em buscas de sentido existencial nos templos das redes sociais, nem sempre adequados para suas idades. Perdidos em templos que agridem a vida com drogas, bebidas e irresponsabilidades afetivas. Jesus estava perdido no templo, muitos e muitos filhos  de nossos tempos, vivem perdidos em templos que não celebram e nem protegem a vida.

Contemplando a realidade de Jesus perdido no templo e encontrado por seus pais, gostaria de perguntar a cada um de vocês, especialmente aos pais: quem são os vossos filhos ? Gostaria de perguntar também aos filhos : em que templos vocês alimentam suas vidas? — Em templos dedicados a Deus ou em templos dedicados a extravagâncias de toda sorte. A Palavra que ouvimos, embora resumidamente, apresenta três características de como a Bíblia entende quem são os filhos  — não dentro das famílias — mas para as famílias. Primeiro: os filhos  são dom Deus. Segundo: a Palavra de Deus incentiva os pais a consagrarem seus filhos  a Deus. Terceiro: os pais são convidados a conduzir seus filhos  nos caminhos de Deus, iluminando-os com os Mandamentos divinos. Questiono se vocês, pais , acolhem seus filhos  como dons presenteados por Deus; questiono se vocês, filhos, caminham nos caminhos de Deus, iluminados pelos Mandamentos. A Palavra que acabamos de ouvir ensina que, para Deus, a família é um templo sagrado e quem dela se afasta, corre o risco de se perder em espaços de morte.

A Festa da Sagrada Família compromete cada um de nós, no dia de hoje, porque todos nascemos numa família e vivemos numa família. Sabemos que existem milhares de famílias desajustadas, com filhos perdidos em templos que não são de Deus. Hoje, a Palavra de Deus nos desafia a transformar a nossa casa; a casa onde moramos com nossas famílias, em espaço de convivência iluminado pela vontade de Deus. Para que isso aconteça, a 2ª leitura tem uma proposta interessante: propõe que o relacionamento familiar se ilumina com a luz dos Mandamentos divinos. Quando nossas casas forem iluminadas com a luz dos Mandamentos, podemos orientar nossos filhos  a colocar suas vidas no caminho de Deus, nos caminhos do bem, nos caminhos da alegria e da paz. Por isso, vou concluir convidando e, mais que simplesmente convidar, vou insistir com vocês para que nossas famílias iluminem suas casas com a luz dos Mandamentos divinos. Amém!








segunda-feira, dezembro 27, 2021

MISSA DO DIA DE NATAL






A transformação da “Palavra” em “carne” (em menino do presépio de Belém) é a espantosa aventura de um Deus que ama e que, por amor, aceita revestir-Se da nossa fragilidade para nos dar vida em plenitude. Neste dia, somos convidados a contemplar, numa atitude de serena adoração, esse incrível passo de Deus, expressão extrema de um amor sem limites.

Acolher a “Palavra” é deixar que Jesus nos transforme, nos dê a vida plena, a fim de nos tornarmos verdadeiramente “filhos de Deus”. O presépio que hoje contemplamos é, apenas, um quadro bonito e terno, ou uma interpelação a acolher a “Palavra”, de forma a crescermos até à dimensão do homem novo?

Hoje, como ontem, a “Palavra” continua a confrontar-se com os sistemas geradores de morte e a procurar eliminar na origem tudo o que rouba a vida plena e a felicidade do homem. Sensíveis à “Palavra”, embarcados na mesma aventura de Jesus – a “Palavra” viva de Deus – como nos situamos diante de tudo aquilo que rouba a vida ao homem? Podemos pactuar com a mentira, o oportunismo, a corrupção, a violência, a exploração dos pobres, a miséria, as limitações aos direitos do homem, a destruição da dignidade dos mais fracos?

A luz da esperança é uma necessidade para nosso mundo, especialmente marcado pelo desânimo depois de dois anos de pandemia. O desânimo é a ausência da luz e, quanto mais o desânimo cresce, mais densas se tornam as trevas. O contrário do desânimo é a alegria que produz um coração novo e animado: “uma luz já se levanta para os justos, e a alegria para os retos corações” (SR MN). Luz para os justos, luz de alegria para quem vive na retidão, na honestidade, na confiança esperançosa que Deus iluminará nossa gente com a alegria da sua presença entre nós. Celebrar o Natal do Senhor é celebrar a “Noite Feliz” da luz divina iluminando nossa terra.










MISSA DO GALO








Hoje, na alegria que o Natal nos presenteia, convido você, convido sua família e convido toda a nossa comunidade a ir ao encontro do Evangelho para se deixar iluminar pelo Evangelho. Natal é a grande festa do encontro de Deus com a humanidade e nenhum de nós pode faltar a esse encontro. Deixar-se iluminar com a luz da esperança, porque o Evangelho é uma profecia de esperança que fortalece nossos corações desanimados e, depois da nossa peregrinação nas estradas de tantas crises, o Evangelho, com certeza, reanima nossos cansaços com a luz da esperança. Ir ao encontro de Jesus para iluminar nossas vidas com a luz da fraternidade, fazendo-se irmão e irmã de todos, como fez Jesus, nascendo em nossa humanidade. Ir ao encontro de Jesus para iluminar nossas vidas com a luz da paz, para que nos torne instrumentos da paz, construtores da paz. Natal é tempo de iluminação pessoal e de compromisso para acender a luz do Menino Deus na sociedade.

 

Olhando para a imagem do Menino Jesus, no presépio, imagem de um recém-nascido, compreendemos que estamos diante de uma vida nascente. Vida que nasce é anúncio de tempo novo. No Natal, Deus recomeça uma humanidade nova e o início encontra-se no nascimento do Menino Jesus. Assim, o Natal é um grande e solene convite para se recomeçar a viver. Um convite dirigido especialmente para aqueles que entre nós perderam o sentido da própria existência porque sofreram muito nestes dois anos de pandemia, porque se confrontaram ou ainda choram o luto de entes queridos que partiram. O Natal ilumina o tempo de recomeçar. Por isso, desejo feliz Natal a você, iluminando-o com a luz da esperança, na certeza que é possível recomeçar porque o Menino Jesus nasceu para iluminar nossas vidas. Feliz Natal.













terça-feira, dezembro 21, 2021

IV DOMINGO DO ADVENTO




Maria, "A mãe de meu Senhor". Assim o proclama Isabel em alta voz e cheia do Espírito Santo. Isto é certo: para os seguidores de Jesus, Maria é, antes de Tudo, a Mãe de nosso Senhor. Daí parte sua grandeza. Os primeiros cristãos nunca separam Maria de Jesus. Eles são inseparáveis. "Bendita por Deus entre todas as mulheres", ela nos oferece Jesus, "fruto bendito de seu ventre". Maria, a crente. Isabel proclama Maria feliz porque ela "acreditou". Maria é grande não simplesmente por sua maternidade biológica, mas por ter acolhido com fé o chamado de Deus para ser Mãe do Salvador. Ela soube ouvir a Deus; guardou sua Palavra dentro de seu coração; meditou-a; a pòs em prática cumprindo fielmente sua vocação. Maria é mãe crente.

Maria, a evangelizadora. Maria oferece a todos a salvação de Deus, que ela acolheu em seu próprio Filho. Essa é sua grande missão e seu servico. De acordo com o relato, Maria evangeliza não só com seus gestos e palavras, mas porque traz consigo, para onde vai, a pessoa de Jesus e seu Espírito. Isto é o essencial do ato evangelizador.

Maria, portadora de alegria. A saudação de Maria comunica a alegria que brota de seu Filho Jesus. Ela foi a primeira a ouvir o convite de Deus: "Alegra-te.., o Senhor está contigo". Agora, a partir de uma atitude de serviço e de ajuda a quem precisa, Maria irradia a Boa Notícia de Jesus, o Cristo, que ela sempre traz consigo. Ela é para a Igreja o melhor modelo de uma evangelização prazerosa.



segunda-feira, dezembro 13, 2021

III DOMINGO DO ADVENTO









O amor é a energia que dá verdadeira vida à sociedade. Em toda civilização há forças que geram vida, verdade e justiça, e forças que provocam morte, mentira e indignidade. Nem sempre é fácil detectá-las, mas na raiz de todo impulso de vida está sempre o amor. Por isso, quando numa sociedade se sufoca o amor, está-se sufocando ao mesmo tempo a dinâmica que leva ao crescimento humano e à expansão da vida. Daí a importância de cuidar socialmente do amor e de lutar contra tudo aquilo que pode destruí-lo. Uma forma de matar o amor pela raiz é a manipulação das pessoas. Na sociedade atual proclamam-se em voz alta os direitos da pessoa, mas depois os indivíduos são sacrificados ao lucro, à utilidade ou ao desenvolvimento do bem-estar. Produz-se então aquilo que chamo de "a eutanásia da liberdade", Há um número cada vez maior de pessoas que vivem uma não liberdade "confortável, cômoda, razoável, democrática". Vive-se bem, mas sem conhecer a verdadeira liberdade nem o amor. Outro risco para o amor é o funcionalismo. Na sociedade da eficácia o importante não são as pessoas, mas a função que elas exercem. O indivíduo fica facilmente reduzido a uma peça da engrenagem: no trabalho é um empregado, no consumo é um cliente, na política é um voto, no hospital é um número de cama… Nesta sociedade, as coisas funcionam; as relações entre as pessoas morrem.

Outro modo frequente de sufocar o amor é a indiferença. O funcionamento da sociedade moderna concentra os indivíduos em seus próprios interesses. Os outros são uma "abstração". Publicam-se estudos e estatísticas, por trás dos quais se oculta o sofrimento das pessoas concretas. Não fácil sentir-nos responsáveis. É a administração pública que deve ocupar-se desses problemas. O que cada um de nós pode fazer? Diante de tantas formas de desamor, o Batista sugere uma postura clara: "Quem tiver duas túnicas, reparta-as com quem não tem; e quem tiver comida faça o mesmo". O que podemos fazer? Simplesmente compartilhar mais o que temos com aqueles que vivem em necessidade.

Apesar de toda a informação fornecida pelos meios de comunicação, temos dificuldade em tomar consciência de que vivemos numa espécie de "ilha da abundância", no meio de um mundo no qual mais de um terço da humanidade vive na miséria. No entanto, basta voar algumas horas em qualquer direção para topar com a fome e a destruição. Esta situação só tem um nome: injustiça. E só admite uma explicação: inconsciência. Como podemos sentir-nos humanos quando a poucos quilômetros de nós o que são, definitivamente, seis mil quilômetros? - há seres humanos que não têm casa nem terra alguma para viver, homens e mulheres que passam o dia procurando algo para comer, crianças que jã não poderão superar a desnutrição? Nossa primeira reação costuma ser quase sempre a mesma: "Mas nós, o que podemos fazer diante de tanta miséria?" Enquanto nos fazemos perguntas deste gênero, sentimo-nos mais ou menos tranquilos. E vêm as justificativas de sempre: não é fácil estabelecer uma ordem internacional mais justa; é preciso respeitar a autonomia de cada país; é difícil assegurar canais eficazes para distribuir alimentos; mais ainda mobilizar um país para que saia da miséria.


quinta-feira, dezembro 09, 2021

A IMACULADA CONCEIÇÃO

 







Muitas meninas recebem, no Batismo, o belo nome de Maria da Conceição ou Conceição de Maria ou, simplesmente, Conceição, homenageando Maria, a Mãe de Jesus, na sua Imaculada Conceição, que hoje celebramos. Honramos assim o privilégio singular concedido por Deus à Virgem Maria, escolhida para a Mãe de Jesus, o Filho de Deus encarnado, Salvador do gênero humano, preservando-a, em vista dos méritos dele, desde a sua concepção ou conceição, da herança do pecado original.

Este pecado original, em Adão uma falta voluntária, nos outros homens se constitui na privação da graça divina, que havia sido concedida a toda a humanidade na pessoa do primeiro homem. A graça, por ele perdida para si e para todos os seus descendentes, foi recuperada pelo segundo Adão, Jesus Cristo, pela sua Redenção, que nos alcança e santifica através do Batismo.Ora, Deus havia prometido, no momento do pecado de Adão, que uma mulher com o seu filho, o futuro Salvador, venceria completamente o demônio. Não teria, pois, nenhum pecado. Não teria, em nenhum instante, a menor privação da graça divina. Por isso, essa mulher especial, Maria, escolhida para a Mãe do Redentor, foi saudada pelo Anjo mensageiro de Deus com as palavras: “Ave, ó cheia de graça (agraciada de modo especial) ..., bendita entre as mulheres”, ou seja, sem pecado (privação da graça). A Redenção de Cristo a atingiu, de modo preventivo, preservando-a, por privilégio único, do pecado que atinge a todos os homens.

Recordamos que a padroeira oficial do Brasil é Nossa Senhora da Conceição, vulgarmente chamada de Aparecida.

 

Mas, por que honramos Maria, de modo tão especial?

“O nosso mediador é só um, segundo a palavra do Apóstolo: ‘não há senão um Deus e um mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, que Se entregou a Si mesmo para redenção de todos’ (1 Tim. 2, 5-6). Mas a função maternal de Maria em relação aos homens de modo algum ofusca ou diminui esta única mediação de Cristo; manifesta antes a sua eficácia. Com efeito, todo o influxo salvador da Virgem Santíssima sobre os homens se deve ao beneplácito divino e não a qualquer necessidade; deriva da abundância dos méritos de Cristo, funda-se na Sua mediação e dela depende inteiramente, haurindo aí toda a sua eficácia; de modo nenhum impede a união imediata dos fiéis com Cristo, antes a favorece” (Lumen Gentium 60).

“A Virgem Santíssima, predestinada para Mãe de Deus desde toda a eternidade simultaneamente com a encarnação do Verbo, por disposição da divina Providência foi na terra a nobre Mãe do divino Redentor, a Sua mais generosa cooperadora e a escrava humilde do Senhor. Concebendo, gerando e alimentando a Cristo, apresentando-O ao Pai no templo, padecendo com Ele quando agonizava na cruz, cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É por esta razão nossa mãe na ordem da graça” (Lumen Gentium 61).

 

Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan


segunda-feira, dezembro 06, 2021

II DOMINGO DO ADVENTO

 




Temos uma estranha tentação de separar duas histórias: a história divina, narrada na Bíblia, e a história humana, narrada nos livros de história. O Evangelho que acabamos de ouvir faz questão de ressaltar que existe uma única história. É o que vemos em Lucas, localizando a profecia de João Batista no meio da história humana que, naquele tempo (e também hoje) tinha como protagonistas políticos medíocres, sacerdotes hipócritas, marcados pela corrupção social e pelo pecado. João Batista não desenvolve sua atividade profética numa sociedade diferente; ele profetiza no meio da sociedade do seu tempo. A presença de Deus na história humana manifesta-se no Antigo Testamento com vários profetas e o mesmo acontece no Novo Testamento, com João Batista, como ouvimos no Evangelho. De nossa parte, como batizados, somos desafiados a profetizar em nossos dias, em nossa história, no chão onde pisamos.

Num primeiro momento, tem-se a impressão que João Batista foge e, indo ao deserto criticar a sociedade de longe. Mas, considerando melhor, temos três aspectos que merecem atenção: a necessidade de tomar distância para ter outro ponto de vista, a importância do silêncio do deserto para refazer o coração angustiado pela indignação, e a necessidade de dar tempo para refletir sobre os acontecimentos. Muitas vezes, temos a estranha mania de querer mudar as coisas no exterior: não se está contente com o trabalho; muda-se de emprego. Não se está bem com a família, separa-se. Olhemos para João. A sua vida é uma profecia que ensina a olhar dentro da gente, a partir do silêncio do deserto. Quando não se toma distância, com o tempo, até o erro torna-se normal.

João Batista é um verdadeiro desafio colocado diante de cada um de nós. Pela sua vida, somos desafiados a romper com estruturas sociais automatizadas que só servem para garantir as benesses de ricos e poderosos. Desafiados a caminhar contracorrente tornando-se um profeta evangelizador. Volto a lembrar que desde o Batismo, recebemos a missão de profetizar. Paulo, na 2ª leitura, não caracteriza o profeta evangelizador pela pregação, mas como divulgador do Evangelho. Existem muitos modos para se divulgar o Evangelho. Um deles, como dizia o salmo responsorial, é semeando silenciosamente a semente do Evangelho. Sem barulho, sem show, mas no silêncio, como silencioso é germinar da vida escondida dentro da semente. Nós profetizamos quando divulgamos o Evangelho, semente divina trazida a terra para, aqui na terra, se caminhar nos caminhos de Deus. Amém!









quinta-feira, dezembro 02, 2021

ARMANDO O PRESÉPIO DE NATAL






Já estamos em um novo Ano Litúrgico, no Advento, tempo da “bela tradição das famílias prepararem o Presépio, e o costume de o armarem nos lugares de trabalho, nas escolas, nos hospitais, nos estabelecimentos prisionais, nas praças” ...: é assim que começa a Carta Apostólica do Papa Francisco, “Sinal Admirável”, sobre o valor e o significado do Presépio.

“Representar o acontecimento da natividade de Jesus equivale a anunciar, com simplicidade e alegria, o mistério da encarnação do Filho de Deus. O Presépio é como um Evangelho vivo que transvaza das páginas da Sagrada Escritura. Ao mesmo tempo que contemplamos a representação do Natal, somos convidados a colocar-nos espiritualmente a caminho, atraídos pela humildade d’Aquele que Se fez homem a fim de Se encontrar com todo o homem, e a descobrir que nos ama tanto, que Se uniu a nós para podermos, também nós, unir-nos a Ele. O evangelista Lucas limita-se a dizer que, tendo-se completado os dias de Maria dar à luz, ‘teve o seu filho primogênito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria’ (2, 7). Jesus é colocado numa manjedoura, que, em latim, se diz praesepium, donde vem a nossa palavra presépio. Ao entrar neste mundo, o Filho de Deus encontra lugar onde os animais vão comer. A palha torna-se a primeira enxerga para Aquele que Se há de revelar como ‘o pão vivo, o que desceu do céu’ (Jo 6, 51). Uma simbologia, que já Santo Agostinho, a par doutros Padres da Igreja, tinha entrevisto quando escreveu: ‘Deitado numa manjedoura, torna-Se nosso alimento’. Na realidade, o Presépio inclui vários mistérios da vida de Jesus, fazendo-os aparecer familiares à nossa vida diária”.

A ideia dessa representação é atribuída a São Francisco de Assis: “Quero representar o Menino nascido em Belém, para de algum modo ver com os olhos do corpo os incômodos que Ele padeceu pela falta das coisas necessárias a um recém-nascido, tendo sido reclinado na palha duma manjedoura, entre o boi e o burro” ... “O Presépio é um convite a ‘sentir’, a ‘tocar’ a pobreza que escolheu, para Si mesmo, o Filho de Deus na sua encarnação, tornando-se assim, implicitamente, um apelo para O seguirmos pelo caminho da humildade, da pobreza, do despojamento, que parte da manjedoura de Belém e leva até à Cruz, e um apelo ainda a encontrá-Lo e servi-Lo, com misericórdia, nos irmãos e irmãs mais necessitados”.

“‘Vamos a Belém ver o que aconteceu e que o Senhor nos deu a conhecer’ (Lc 2, 15) ...: os pastores tornam-se as primeiras testemunhas do essencial, isto é, da salvação que nos é oferecida... Pouco a pouco, o Presépio leva-nos à gruta, onde encontramos as figuras de Maria e de José. Maria é uma mãe que contempla o seu Menino e O mostra a quantos vêm visitá-Lo... Ao lado de Maria, em atitude de quem protege o Menino e sua mãe, está São José... É o guardião” ... “O coração do Presépio começa a palpitar, quando colocamos lá, no Natal, a figura do Menino Jesus. Assim Se nos apresenta Deus, num menino, para fazer-Se acolher nos nossos braços... Em Jesus, Deus foi criança e, nesta condição, quis revelar a grandeza do seu amor” ...

 

Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan

segunda-feira, novembro 29, 2021

I DOMINGO DO ADVENTO








Por isso quando a esperança se apaga, apaga-se também a vida, a pessoa já não cresce, não busca, não luta, pelo contrário, se apequena, desaba, deixa se levar pelos acontecimentos. Se se perde a esperança, perde-se tudo. Por isso, a primeira coisa que é preciso alimentar no coração da pessoa no seio da sociedade ou na relação com Deus, é a esperança.

A esperança não consiste na reação otimista de um momento. É, antes, um estilo de vida, uma maneira de enfrentar o futuro de forma positiva e confiante, sem deixar-nos cair no derrotismo. O futuro pode ser mais ou menos favorável, mas a característica peculiar de quem vive com esperança é sua atitude positiva, seu desejo de viver e de lutar, sua postura decidida e confiante. Nem sempre é fácil. É preciso trabalhar a esperança.

A primeira coisa é olhar para frente. Não ficar no que já passou. Não viver de recordações ou nostalgias. Não ficar sentindo saudades de um passado talvez mais feliz, mais seguro ou menos problemático. É agora que devemos viver enfrentando o futuro de maneira positiva.

A esperança não é uma atitude passiva, é um estímulo que nos impele à ação. Quem vive animado pela esperança não cai na inércia. Pelo contrário, se esforça para mudar a realidade e torná-la melhor. Quem vive com esperança é realista, assume os problemas e as dificuldades, mas o faz de maneira criativa, dando passos, buscando soluções e transmitindo confiança. A esperança não se sustenta no ar. Tem suas raízes na vida. Em geral, as pessoas vivem de "pequenas esperanças" que vão se realizando ou vão se frustrando. Precisamos valorizar e alimentar essas pequenas esperanças, mas o ser humano precisa de uma esperança mais radical e indestrutível, que possa sustentar-se quando toda outra esperança desaba. Assim é a esperança em Deus, salvador último do ser humano. Quando andamos cabisbaixos e com o coração desanimado, precisamos escutar estas inesquecíveis palavras de Jesus: "Levantai a cabeça, pois se aproxima vossa libertação".


sábado, novembro 27, 2021

VISÕES DE SÃO CONRADO





Pediu a São Conrado, Bispo de Constança, que se dignasse fazer a consagração da igreja de sua Abadia. O Prelado atendendo a solicitação, dirigiu-se ao Convento, acompanhado do Santo Bispo de Augsbourg, Ulric, e de uma comissão de cavalheiros da sociedade.

No dia fixado para a cerimônia, São Conrado e alguns religiosos se dirigiram a igreja, alta noite, e se puseram em oração. De repente, viram que a igreja se iluminara de uma luz celeste e que o próprio Jesus Cristo, acolitado pelos quatro evangelistas, celebrava no altar o oficio da Dedicação. Anjos espargiam perfumes à direita e à esquerda do Divino Pontífice; o apóstolo São Pedro e o Papa São Gregório seguravam as insígnias do pontificado; e diante do altar se achava a Santa Mãe de Deus, circundada de uma auréola de glória. Um coro de anjos, regido por São Miguel, fazia vibrar as abóbadas do templo com seus cantos celestiais. Santo Estêvão e São Lourenço, os mais ilustres mártires diáconos, desempenham as suas funções. São Conrado refere em uma de suas obras as diversas exclamações dos anjos no canto do Sanctus, do Agnus Dei e do Dominus vobiscum final. Ao Sanctus, entre outras, diziam eles: “Tende piedade de nós, ó Deus, cuja santidade refulge no santuário da Virgem gloriosa. Bendito seja o Filho de Maria, que vem a esse lugar para reinar eternamente!”

Maravilhado com semelhante aparição, o Bispo continuou a rezar até onze horas do dia. E o povo esperava com ansiedade o início da cerimônia, sem que, no entanto, alguém ousasse indagar a causa dessa demora.

Afinal, alguns religiosos se acercam do Prelado e lhe pedem que comece a solenidade. Mas São Conrado, sem deixar o lugar onde rezava, conta com simplicidade tudo o que presenciara e ouvira. Sua narração fez supor que ele estivesse sob a ilusão de um sonho. Finalmente, o santo Bispo, cedendo às instâncias de todos, dispôs-se a proceder a consagração da igreja. Foi então que aos ouvidos dos fiéis escutaram estas palavras, pronunciadas por uma voz angélica, que repercutiu em toda a assembléia, dizendo mais de uma vez, na linguagem da Igreja: “Cessa, cessa, frater! Capella divinitas consecrata est: detende-vos, detende-vos, meu irmão, a capela já foi divinamente consagrada.”

Dezessete anos mais tarde, São Contado, Santo Ulrico e outras testemunhas oculares do acontecimento, encontrando-se reunidos em Roma, prestaram acerca dele um solene testemunho. E depois de todas as necessárias informações jurídicas, Leão VIII deu publicidade ao fato por meio de uma bula especial, que foi confirmada pelos papas Inocêncio IV, Martinho V, Nicolau IV, Eugênio VI, Nicolau V, Pio II, Júlio II, Leão X, Pio IV, Gregório XIII, Clemente VII e Urbano VIII. E, a 15 de maio de 1793, Pio VI ratificou os atos de seus predecessores, a despeito dos céticos, sempre prontos a duvidar do que lhes não convém, e cheios de credulidade absurda para com o que os lisonjeia.

(MÊS DE NOSSA SENHORA DO SANTISSIMO SACRAMENTO – Pe. Alberto Tesnière, S.S.S. – Tip. Maria Auxilium, S.P. – la. edição, 1946, pp. 76 -77


quinta-feira, novembro 25, 2021

OBRIGADO, MEU DEUS!







Hoje, dia 25 de novembro, celebra-se o Dia Nacional de Ação de Graças. É uma festa de origem norte-americana (Thanksgiving), regulamentada no calendário brasileiro em 1949, pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra, por sugestão de Joaquim Nabuco, entusiasmado com as comemorações que vira na Catedral de São Patrício, quando embaixador em Washington. No Brasil, o Dia Nacional de Ação de Graças vem sendo ofuscado pelo Black Friday, também de origem americana, promoção de venda antes das vendas de Natal, festa cristã também comercializada.

Mas, mesmo sendo de origem não católica, essa celebração pode ser uma boa ocasião para darmos graças a Deus, por todos os seus benefícios e graças: nossa existência, a natureza que ele nos deu, a família, os amigos, as graças espirituais e materiais, com o reconhecimento da sua suprema soberania e bondade, por tudo de bom que recebemos durante o ano. Por isso, é um bom costume cristão, herdado de nossos antepassados, dizer sempre “graças a Deus!”. E é dia de agradecimento também ao nosso próximo, especialmente aos nossos pais, parentes e amigos.

“São Paulo inculcava nas suas cartas este contínuo espírito de gratidão: ‘Em todas as circunstâncias dai graças, porque esta é a vosso respeito a vontade de Deus em Jesus Cristo’ (1 Tess. 6, 18); ‘Enchei-vos do Espírito... dando sempre graças por tudo a Deus Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo’ (cf. Ef. 5, 18-20). É uma atitude ‘eucarística’, que vos dá paz e serenidade nas fadigas, vos liberta de todo o apego egoísta e individualista, vos torna dóceis à vontade do Altíssimo, também nas exigências morais mais difíceis, vos abre para a solidariedade e para a caridade universal, vos faz compreender como é absolutamente necessária a oração, e sobretudo a vida eucarística mediante a Santa Missa, o ato de Ação de graças por excelência, para viver e testemunhar coerentemente a própria fé cristã. Agradecer significa acreditar, amar, dar! E com alegria e generosidade!” (São João Paulo II, homilia no dia de ação de graças 9/11/1980).

E agradecemos a Deus as alegrias e até os sofrimentos, pois são para o nosso bem e deles podemos tirar bons frutos. Celebramos há pouco a memória de Santa Isabel, rainha da Hungria. Quando no castelo, aproveitou da sua influência para fazer o bem. Sempre agradecia a Deus. Poder-se-ia dizer que isso é fácil pela vida rica que tinha! Mas a desgraça lhe bateu à porta: após a morte do marido, foi expulsa da corte pelos usurpadores do reino, insultada por todos, até pelos mendigos e enfermos que ela tinha socorrido, e teve que se refugiar, com os filhos pequenos, num curral de porcos. Dali, de madrugada, ouviu o sino de um convento, que ela tinha ajudado a construir, e lá foi pedir que rezassem em ação de graças, pela tribulação que ela estava passando!

Em português, como forma de agradecer, temos a belíssima palavra “obrigado”. Significa o mais profundo grau da gratidão, não só um reconhecimento intelectual do favor recebido (thank you), nem apenas uma simples retribuição com outra mercê (merci, gracias), mas uma vinculação, um comprometimento a continuar a servir, a retribuir favores, a quem nos prestou algum benefício. É nesse sentido que dizemos a Deus e aos irmãos: “muito obrigado!”.


Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan

terça-feira, novembro 09, 2021

A ESPERANÇA NA VIDA ETERNA








Lembrando-nos dos nossos falecidos, finados, animamo-nos com a virtude da esperança. “Esta é, de fato, uma palavra central da fé bíblica, a ponto de, em várias passagens, ser possível intercambiar os termos ‘fé’ e ‘esperança’. Assim, a Carta aos Hebreus liga estreitamente a ‘plenitude da fé’ (10,22) com a ‘imutável profissão da esperança’ (10,23). O Evangelho não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera fatos e muda a vida. A porta tenebrosa do tempo, do futuro, foi aberta de par em par. Quem tem esperança, vive diversamente; foi-lhe dada uma vida nova” (Bento XVI, enc. Spe Salvi, 2).

“O cristianismo não tinha trazido uma mensagem sócio revolucionária semelhante à de Espártaco, que tinha fracassado após lutas cruentas. Jesus não era Espártaco, não era um guerreiro em luta por uma libertação política, como Barrabás ou Bar-Kochba. Aquilo que Jesus – Ele mesmo morto na cruz – tinha trazido era algo de totalmente distinto: o encontro com o Senhor de todos os senhores, o encontro com o Deus vivo e, deste modo, o encontro com uma esperança que era mais forte do que os sofrimentos da escravatura e, por isso mesmo, transformava a partir de dentro a vida e o mundo” (idem ib. 4).

“No décimo primeiro capítulo da Carta aos Hebreus (v. 1), encontra-se, por assim dizer, uma certa definição da fé que entrelaça estreitamente esta virtude com a esperança... A fé não é só uma inclinação da pessoa para realidades que hão de vir, mas estão ainda totalmente ausentes; ela dá-nos algo. Dá-nos já agora algo da realidade esperada, e esta realidade presente constitui para nós uma ‘prova’ das coisas que ainda não se veem. Ela atrai o futuro para dentro do presente, de modo que aquele já não é o puro ‘ainda-não’. O fato de este futuro existir, muda o presente; o presente é tocado pela realidade futura, e assim as coisas futuras derramam-se nas presentes e as presentes nas futuras” (Idem ib. 7).

No rito do Batismo na forma tradicional, o sacerdote pergunta aos padrinhos, que respondem pelo afilhado: “Que pedes à Igreja?” A resposta: “A fé”. “E que te alcança a fé?” “A vida eterna”. A fé é a chave para a vida eterna. Fé é substância da Esperança.

“Aqui, porém, surge a pergunta: Queremos nós realmente isto: viver eternamente? Hoje, muitas pessoas rejeitam a fé, talvez simplesmente porque a vida eterna não lhes parece uma coisa desejável. Não querem de modo algum a vida eterna, mas a presente... Certamente a morte queria-se adiá-la o mais possível... ‘Sem dúvida, a morte não fazia parte da natureza, mas tornou-se natural; porque Deus não instituiu a morte ao princípio, mas deu-a como remédio. Condenada pelo pecado a um trabalho contínuo e a lamentações insuportáveis, a vida dos homens começou a ser miserável. Deus teve de pôr fim a estes males, para que a morte restituísse o que a vida tinha perdido. Com efeito, a imortalidade seria mais penosa que benéfica, se não fosse promovida pela graça’ (S. Ambrósio). Antes, ele tinha dito: ‘Não devemos chorar a morte, que é a causa de salvação universal’” (Idem ib 10).

 

Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan









sexta-feira, outubro 22, 2021

SÍNODO E MISSÃO






O dia mundial das Missões, que será acontecerá no próximo domingo, data criada em 1926 pelo Papa Pio XI, é celebrado anualmente em toda a Igreja, para recordar o caráter missionário que deve sempre estar presente na ação eclesial, incentivando a todos os cristãos a se comprometerem como missionários, emissários da evangelização. O Mês de outubro é o mês das Missões. Missão é o mandato que Jesus deu à sua Igreja: “Ide e fazei discípulos todos os povos...” (Mt 28, 19).

Domingo passado, tivemos a abertura da fase do Sínodo dos Bispos em todas as dioceses, como preparação para a grande assembleia do Sínodo dos Bispos no Vaticano, em outubro de 2023, com o tema “Por uma Igreja Sinodal: Comunhão, Participação e Missão”.

Em sua mensagem para o dia das Missões deste ano, o Papa Francisco usou como lema a frase dos Apóstolos: “Não podemos deixar de afirmar o que vimos e ouvimos” (At 4, 20).

“Quando experimentamos a força do amor de Deus, quando reconhecemos a sua presença de Pai na nossa vida pessoal e comunitária, não podemos deixar de anunciar e partilhar o que vimos e ouvimos. A relação de Jesus com os seus discípulos, a sua humanidade que nos é revelada no mistério da Encarnação, no seu Evangelho e na sua Páscoa mostram-nos até que ponto Deus ama a nossa humanidade e assume as nossas alegrias e sofrimentos, os nossos anseios e angústias (cf. Conc. Ecum. Vat II, Const. past. Gaudium et spes, 22). Tudo, em Cristo, nos lembra que o mundo em que vivemos e a sua necessidade de redenção não Lhe são estranhos e também nos chama a sentirmo-nos parte ativa desta missão: ‘Ide às saídas dos caminhos e convidai todos quantos encontrardes’ (cf. Mt 22, 9). Ninguém é estranho, ninguém pode sentir-se estranho ou afastado deste amor de compaixão”.

“A história da evangelização tem início com uma busca apaixonada do Senhor, que chama e quer estabelecer com cada pessoa, onde quer que esteja, um diálogo de amizade (cf. Jo 15, 12-17). Os Apóstolos são os primeiros que nos referem isso, lembrando inclusive a hora do dia em que O encontraram: ‘Eram as quatro da tarde’ (Jo 1, 39). A amizade com o Senhor, vê-Lo curar os doentes, comer com os pecadores, alimentar os famintos, aproximar-Se dos excluídos, tocar os impuros, identificar-Se com os necessitados, fazer apelo às bem-aventuranças, ensinar de maneira nova e cheia de autoridade, deixa uma marca indelével, capaz de suscitar admiração e uma alegria expansiva e gratuita que não se pode conter. Como dizia o profeta Jeremias, esta experiência é o fogo ardente da sua presença ativa no nosso coração que nos impele à missão, mesmo que às vezes implique sacrifícios e incompreensões (cf. 20, 7-9). O amor está sempre em movimento e põe-nos em movimento, para partilhar o anúncio mais belo e promissor: ‘Encontramos o Messias’ (Jo 1, 41)”.

“Como os apóstolos e os primeiros cristãos, também nós exclamamos com todas as nossas forças: ‘não podemos deixar de afirmar o que vimos e ouvimos’ (At 4, 20)”.

 

Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan


segunda-feira, outubro 04, 2021

XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM






A criação da mulher (1L) é considerada como necessidade humana para o relacionamento amoroso gerador da vida. Depois de estabelecer relação com o mundo, Adão (homem da terra) percebe uma ausência, que nem mesmo os animais, seres vivos, são capazes de preencher. Entende-se que a verdadeira comunhão de vida não acontece pela posse, mas pela possibilidade de pertença recíproca, e esta só é possível quando a comunhão é estabelecida em igual dignidade.

O sono de Adão, provocado por Deus (1L), é um modo literário para dizer que foi no silêncio do mistério divino que Deus criou a mulher. Adão e Eva se reconhecem na mesma dignidade e se acolhem concretamente, como carne da mesma carne, ossos do mesmo osso. Na reciprocidade do "eu" e do "tu" não acontece a dissolvência, mas o acolhimento “no nós” que comporta igual dignidade e relacionamento dialógico. No "mono-logo" (monólogo), o outro é obrigado a entrar no “meu esquema”; no "dia-logo" (diálogo) acontece o acolhimento, o favorecimento da partilha de experiências existenciais. Deus nos criou homem e mulher (1L) para o diálogo, para a convivência de vidas capazes de gerar mais vida.

Em síntese, compreendemos que a vida conjugal, do homem e da mulher, acontece pelo acolhimento, que se realiza no diálogo para gerar mais vida. Isto só é possível pelo e no amor oblativo, o amor que ama sem cobranças e sem esperar nada em troca, como é o modo divino de amar. Amor que se realiza trilhando os caminhos de Deus (SR); motivo pelo qual Jesus recusa a prática do divórcio (E).

O ponto central da recusa do divórcio, da parte de Jesus, encontra-se na "dureza de coração" (E). Jesus explica que as concessões a favor do divórcio aconteceram no tempo da "dureza de coração"; agora é necessário restituir a vontade originária de Deus, que criou o homem e a mulher não como propriedade um do outro, mas como companheiros de vida que se completam um ao outro no amor e pelo amor.






segunda-feira, setembro 27, 2021

XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM





Para Jesus, a primeira coisa a fazer dentro do grupo de seus seguidores é esquecer-se dos próprios interesses e pôr-se a servir, colaborando juntos em seu projeto de fazer um mundo mais humano. Não é fácil. Às vezes, em vez de ajudar outros crentes, podemos causar-lhe dano.

É o que preocupa Jesus. que entre os seus haja quem “escandalize um destes pequeninos que creem”.  Que entre os cristãos haja pessoas, que com sua maneira de agir, causem dano a crentes mais fracos o os desviem da sua mensagem e do projeto de Jesus. Isso seria desvirtuar seu movimento.

Jesus emprega imagens extremamente duras para que cada um extirpe de sua vida aquilo que se opõe à sua maneira de entender e de viver a existência. Está e jogo “entrar no reino de Deus” ou ficar excluído, “entrar na vida” ou terminar longe dela.

A linguagem de Jesus é metafórica. A “mão” é símbolo da atividade e do trabalho. Jesus emprega suas mãos para abençoar, curar e tocar os excluídos. É mau usá-las para ferir, golpear, submeter ou humilhar. “Se tua mão te escandalizar, corta-a” e renuncia a agir contra o estilo de Jesus.

Também os “pés” podem causar dano se nos levam por caminhos contrários à entrega e ao serviço. Jesus caminha para estar próximo dos mais necessitados e para buscar os que vivem perdidos. “Se teu pé te escandalizar, corta-o” e abandona caminhos errados que não ajudam a ninguém a seguir Jesus.

Os “olhos” representam os desejos e aspirações as pessoas. Se não olharmos as pessoas com o amor e a ternura com que Jesus as olhava, terminaremos pensando só em nosso próprio interesse. “Se teu olho te escandalizar, arranca-o e aprende a olhar a vida de maneira mais evangélica.

Como ocorreu a Jesus esta figura trágica, e ao mesmo tempo cômica, de um homem sem uma das mãos, coxo e sem um dos olhos entrar na plenitude da vida? O que sentiram as pessoas ao ouvi-lo falar assim? Como podemos reagir nós? Por mais dolorosas que sejam, se os cristãos não fizerem opções que assegurem a fidelidade a Jesus, seu projeto não abrirá caminho no Mundo.









segunda-feira, setembro 13, 2021

XXIV DOMINGO DO TEMPO COMUM







1 – O símbolo do caminho

No início do Evangelho, Marcos relata que Jesus caminhava com seus discípulos e, caminhando, perguntou: “quem sou eu para o povo e para vocês?”. Chamo atenção para a palavra “caminho”. É uma palavra simbólica, que usamos para representar a nossa vida. A nossa vida, o nosso viver é um caminho; é uma caminhada. Por isso, a pergunta que ouvimos no Evangelho soa deste modo para nós: quem é Jesus para nós no caminho de nossas vidas? À medida que caminhamos na vida, mudamos nosso modo de pensar e nossos conceitos. Por isso, se temos o mesmo conceito de Jesus trazido da infância, da adolescência, de tempos passados, então algo não está de acordo, no caminho do discipulado. À medida que caminhamos na vida, à medida que convivemos com Jesus, nossa fé vai se transformando; nosso o modo de crer também muda. Muda porque nos tornamos mais amadurecidos.

 

2 – O encontro com o sofrimento

No caminhar de nossas vidas, o conceito que vamos formando de Deus deve mudar; precisa amadurecer. A convivência que temos com Jesus, o modo de crer — se nossa fé produz frutos ou é apenas emocional ou apenas mental, como provoca a 2ª leitura — favorecem a serenidade naqueles encontros mais difíceis de nossas vidas. No caminho da vida, por exemplo, em alguma curva da estrada existencial, nós nos deparamos com o sofrimento; sofrimento pessoal ou sofrimento do outro, no dizer da 1ª leitura. Se caminhamos como discípulos de Jesus, se cultivamos a fé e com ela produzimos frutos, o sofrimento (meu e do outro) torna-se suportável e marcado pela esperança. Até mesmo o sofrimento passa a ter um sentido. O encontro com o sofrimento, para quem não convive com Jesus e não crê de modo frutuoso — produzindo frutos — é mais doloroso, é marcado por queixas, reclamações e pode, até mesmo, ser marcado pela revolta. É nestes momentos desafiadores do caminho da vida que podemos avaliar quem é Jesus para nós e o que representa a fé em nossas vidas.

 

3 – Caminho da oblatividade

No caminho da vida, diz Jesus no Evangelho, é preciso tomar a própria cruz para segui-lo. A espiritualidade e a mística cristã não interpretam este “tomar a cruz” como desejo do sofrimento ou desejo da morte. O “tomar a cruz” significa pertencer a alguém, no sentido de doar a vida por alguém. À medida que caminhamos nos caminhos da vida, podemos escolher viver para nós mesmos ou viver para ofertar a vida; para que o nosso viver produza mais vida. Jesus ensina que quem quiser salvar a própria vida, vai perdê-la; este é o viver para si mesmo. O “tomar a cruz” significa entregar a vida, fazer da própria vida uma oblação para que minha vida produza mais vida. O egoísta, aquele que não “assume a cruz”, não assume o projeto do Reino, destrói-se a si mesmo. O sentido da vida está na cruz, símbolo da oblação da vida. Mas, para bem compreender isso é preciso saber quem é Jesus para mim e transformar a fé em obras. Amém!