O
veemente apelo de Jesus à conversão tem um eco especial neste tempo de
Quaresma. A “conversão” não se traduz no simples arrependimento pelas faltas
cometidas, ou por uma penitência externa que acalme a nossa consciência
culpada; mas implica uma mudança do sentido da nossa vida, de forma a que Deus
volte a ser novamente a nossa referência, o princípio e o fundamento do nosso
projeto. “Converter-se” é mudar o rumo da nossa vida e “voltar para trás” ao
encontro de Deus; “converter-se” é deixar de correr atrás dos nossos interesses
egoístas e abraçar o projeto que Deus tem para nós; “converter-se” é livrar-se
dos preconceitos mesquinhos, dos julgamentos apressados, das leituras parciais,
das condenações sem misericórdia, para passarmos a ver o mundo e os homens com
o olhar bondoso de Deus; “converter-se” é abandonar a indiferença e o egoísmo cômodo
para “ver” os homens e mulheres condenados a uma vida sem saída e para lhes dar
a mão; “converter-se” é rever os valores sobre os quais construímos o nosso
projeto de vida e prescindir daquilo que nos faz mal, que nos escraviza, que
nos torna menos humanos. Neste tempo de Quaresma, estamos dispostos a fazer
esta mudança na nossa vida? Quais são as dimensões, os aspetos, as questões a
que daremos prioridade?
A
parábola da figueira sugere que a conversão não é algo que possamos adiar
indefinidamente. Deus é paciente e cheio de misericórdia; mas quer de nós
respostas concretas e convincentes. Ele não admite que vivamos indecisos ou
acomodados ao nosso bem-estar e que não tenhamos a coragem de assumir as opções
que podem dar sentido à nossa existência. O tempo da nossa vida é limitado e
corre sem nos darmos conta. Se formos adiando, uma e outra vez, as escolhas que
se impõem, estaremos a frustrar o plano de Deus para nós e para o mundo e
estaremos a passar ao lado da vida. Quanto mais depressa brotar em nós o “Homem
novo”, mais depressa encontraremos a nossa realização plena.
Jesus
é bastante claro: uma figueira que não produz frutos é uma árvore inútil, que
não está a cumprir o seu papel. Não serve para nada. É óbvio que Jesus, através
da imagem da figueira, está a falar de nós, a questionar-nos sobre a forma como
nós correspondemos aos cuidados de Deus. Nós, que crescemos na “escola de
Jesus” e que somos constantemente interpelados pelo Evangelho de Jesus,
produzimos, na vida de todos os dias, os frutos saborosos que Deus espera? Os
frutos que produzimos contribuem para tornar mais doce o mundo e a vida de
todos aqueles que caminham ao nosso lado? O que podemos fazer para dar mais
frutos?
Jesus
rejeita categoricamente qualquer relação entre as desgraças que atingem algumas
pessoas e um eventual castigo de Deus pelo pecado. Na verdade, considerar que
Deus é uma espécie de comerciante, com a contabilidade organizada, que conhece
os seus devedores e os castiga pelas suas dívidas, é dar brecha a uma grave
deformação da imagem e da realidade de Deus. Temos de evitar associar Deus aos
males que acontecem no mundo e na vida dos homens. O mal não vem de Deus, mas
sim da nossa debilidade, do nosso pecado, da finitude e dos limites deste mundo
que está, a cada instante, a construir-se. O que Deus faz é estar ao nosso lado
a cada momento, a cuidar das nossas feridas, a apontar-nos o caminho que
devemos percorrer para chegar à vida. Como vemos Deus? Consideramo-lo
responsável pelas coisas que estragam a nossa vida e desfeiam o mundo?