sexta-feira, abril 18, 2025

MISSA DO LAVA PÉS







Hoje Jesus lava os pés, institui o sacerdócio cristão e o sacramento da eucaristia. Lavar os pés dos apóstolos é, na verdade, ensinar-lhes como devem ser sacerdotes e sua função principal, servir eucaristicamente. Isto é, o gesto externo de lavar os pés significa serviço, o qual se dá no sacerdócio, cuja principal função é celebrar a Eucaristia, na qual o próprio Cristo serve os seus fiéis o que há de melhor, pois ele mesmo se dá como banquete sacrificial. Portanto, a centralidade do dia de hoje encontra-se no sacerdócio e na eucaristia como serviços.

Nas horas dos sofrimentos de Jesus, cheias de drama, de dor e de amor, ele “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Ainda que seria suficiente uma simples gota do sangue de Cristo para salvar a todos os seres humanos de todos os tempos, ele quis deixar bem claro que ele nos ama de uma maneira bastante forte: quis derramar todo o seu sangue, quis morrer na cruz, quis deixar o seu sangue e a sua cruz para nós no sacramento da eucaristia. Pois, o que é  a eucaristia senão a atualização do amor doloroso de Cristo na sua paixão, morte e ressurreição? A Missa é o maior mistério de amor ao qual nós temos acesso nos dias atuais, porque atualiza o maior mistério do amor que aconteceu no Universo. Ele nos amou até o fim.

O amor extremo de Jesus Cristo é oferecer a sua morte a cada um de nós como passagem rumo à eternidade. É como se a sua carne, o seu corpo, fosse um muro que se encontra entre o nosso tempo e a eternidade divina. A morte de Jesus fura esse muro de tal maneira que através desse buraco no muro, que é o corpo de Jesus, nós temos acesso ao outro mundo, a feliz eternidade. Consequentemente, sem a generosidade de Jesus na sua paixão e morte, não teríamos esse muro cavado para nós, esse acesso à eternidade, nem teríamos como ir à eternidade do Pai. A Missa, a Eucaristia, é o ponto mais alto do amor de Jesus por nós porque torna presente de maneira sacramental aquele ponto mais alto do amor de Jesus por cada ser humano: sua morte dolorosíssima.

No Evangelho desta Quinta-feira Santa, Jesus, com sua original sabedoria, nos oferece uma outra perspectiva de vida. Sem dúvida alguma, Jesus era um provocador, no sentido etimológico da palavra, (pro-vocar: chamar para frente, desinstalar), que motivava as pessoas a verem as coisas a partir de uma perspectiva diferente da que era habitual.

Mas, custa-nos muito modificar nossa perspectiva; estamos acostumados a um modo fechado de viver, com umas viseiras que não nos permitem captar a vida em sua plenitude e riqueza; com isso nos instalamos no já adquirido e conhecido e atrofiamos em nós o dinamismo que busca abrir a mente e alargar o coração à realidade que nos cerca.

Ver as coisas “por uma outra perspectiva” é muito mais instigante.

Um ponto de vista novo, limpo e original é uma grande ajuda para uma vida sadia.

O que Jesus pretende, no gesto do “lava-pés”, é nos oferecer um novo ponto de vista, um novo ângulo, uma nova perspectiva, fazendo-nos ver a realidade do outro como se fosse pela primeira vez, com um olhar límpido e uma atitude compassiva.

Na noite em que ia ser entregue, Jesus realizou um gesto provocativo: levantou-se da mesa, distanciando-se do lugar reservado àqueles que a presidem e se situou no lugar daqueles que pertencem à categoria dos “servidores”. Jesus sabia que o lugar em que estamos situados condiciona nosso olhar e nossa atitude; por isso, tomou distância e adotou a perspectiva que lhe permitia perceber outras dimensões da vida.

A partir desse lugar tocou de perto o barro, o pó, o mal odor, a sujeira..., tudo isso que aqueles que estão sentados à mesa acreditam estar a salvo ou simplesmente ignoram e desprezam. Rente ao chão e em contato com os pés dos outros, Jesus realizou uma mudança e uma amplitude de visão que lhe fazia perceber tanto as riquezas e dons de cada um como captar a desnudez, a fragilidade e as limitações da corporalidade das pessoas. E, olhadas a partir daí,  Ele deixa transparecer que qualquer pretensão de superioridade ou domínio se revela como ridícula e falsa.

Nesse deslocamento a um “lugar entre tantos outros”, Jesus viu de perto e por dentro àqueles que os outros consideravam distante e fora. Porque para Ele, os maiores e os mais importantes são aqueles que, segundo nossos critérios, não são contados. O lugar em que Jesus decidiu se situar deu origem a “revolução nas relações pessoais”, que tanto nos sobressalta e ao qual tanto nos resistimos. Só o fato da possibilidade desse deslocamento se revela ameaçadora porque nos tira do terreno do conhecido e nos convida a descobrir novos significados que não coincidem com os que consideramos evidentes.

Com o gesto do lava-pés e ao deslocar-se para o lugar do servo, Jesus rompe a verticalidade e a relação senhor-escravo, os de cima e os de baixo, os de dentro e os de fora, inaugurando, assim, a nova ordem circular do Reino, onde ninguém é descartável.

Ali também Ele nos revela-nos um rosto novo de Deus: o Deus cuidadoso e compassivo, identificado com os últimos e que a partir do último, serve, sustenta, universaliza, iguala, inaugurando deste modo a horizontalidade do Reino.