No Domingo passado, com a parábola da figueira infrutífera, a misericórdia divina se manifestava pela paciência e pelo cuidado para com a árvore, símbolo da vida humana. Também na parábola do Pai misericordioso, a paciência volta a aparecer na atitude do Pai (Evangelho), que não se cansa de esperar seu filho perdido no mundo velho para fazer dele uma nova criatura, no dizer de Paulo (2ª leitura). Por isso, a volta para a casa do Pai acontece depois que o jovem entra em si (Evangelho), não permitindo que seu rosto se cubra de vergonha, mas reconhecendo-se um infeliz que clama e será ouvido pelo Pai (salmo responsorial).
A dinâmica da parábola descreve um distanciamento progressivo da parte do filho. Como mostra a experiência, as separações começam a acontecer quando se começam a cortar as raízes. Quando uma das partes começa a colocar defeito no relacionamento com a outra pessoa, então a porta da despedida e da separação começa a ser aberta. É o que aconteceu com o filho mais jovem que, pouco a pouco, vai gastando sua vida e se desligando dos valores de sua família até terminar cuidando dos porcos. De acordo com um ensinamento rabínico, que diz “maldito o homem que cuida de porcos” — animal impuro para os judeus — Jesus demonstra que o distanciamento das raízes da casa do Pai afasta a pessoa dos valores religiosos e humanos, para se tornar um maldito. É no contexto de desastre existencial que o jovem entra em si e resolve voltar para casa. Resolve assumir o caminho da conversão. Nada de excepcional, de visões ou sentimentos profundos, apenas a crueldade de uma vida maldita de quem a partilha com os porcos motivou o jovem a retomar a estrada de regresso para o Pai.
Na volta para casa, Jesus apresenta um Pai totalmente diferente do que se esperava. Em vez de agressivo, um pai compassivo, que vê a situação do filho, se compadece, compreende a sua confiança no acolhimento paterno e age em favor da vida do filho. São os quatro momentos da dinâmica da misericórdia: ver - compadecer-se (sentimento que toca o coração) - compreender (empatia) e ação. Se parar num destes elementos, a misericórdia torna-se sentimentalismo incapaz de resgatar a vida do outro. A ação do Pai misericordioso foi aquela do acolhimento, do perdão, do revestir o filho com roupas de festa e de alegria. Nada de exigências e nem de ameaças. Apenas o acolhimento, porque ele estava morto e reviveu (Evangelho).
Aquele jovem só conseguiu cair em si porque conhecia a misericórdia de seu Pai. Conhecia o coração de seu Pai. Se ele conhecesse o coração do Pai como sendo um coração vingativo, jamais tomaria o caminho de volta para casa. Se alguém tem receio ou medo de se aproximar de nós, isto pode ser uma demonstração que não somos misericordiosos porque não oferecemos condições de acolhimento. Quando os filhos têm medo dos pais, os pais devem se perguntar se estão sendo misericordiosos com seus filhos ou não. A confiança de contar as coisas para os pais, a confiança de uma filha revelar seus segredos para a mãe, de um filho pedir conselhos para os pais demonstram que ali, naquele pai e naquela mãe existe um coração compreensivo, capaz de acolher misericordiosamente. Pensemos, pois, se como filhos e filhas de Deus, fizemos a escolha certa para nossas vidas. Se nossa escolha foi equivocada, conhecemos o coração do Pai e sabemos que podemos voltar porque, no momento do encontro ele fará festa em nosso coração. Amém!