segunda-feira, março 28, 2022

IV DOMINGO DA QUARESMA






Em nenhuma outra parábola Jesus conseguiu penetrar tão profundamente no mistério de Deus e no mistério da condição humana. Nenhuma outra é tão atual para nós como esta do "pai bom".

O filho mais moço diz ao pai: "Pai, dá-me a parte da herança que me cabe". Ao reclamá-la, está de alguma forma pedindo a morte do pai. Quer ser livre, romper amarras. Não será feliz enquanto seu pai não desaparecer. O pai consente com seu desejo sem dizer nenhuma palavra: o filho deve escolher livremente seu caminho.

Não é esta a situação atual? Muitos querem hoje ver-se livres de Deus, ser felizes sem a presença de um Pai eterno em seu horizonte. Deus deve desaparecer da sociedade e das consciências. E, da mesma forma que na parábola, o Pai mantém silêncio. Deus não coage ninguém.

O filho parte para "um país distante". Precisa viver longe de seu pai e de sua família. O pai o vê partir, mas não o abandona; seu coração de pai o acompanha; cada manhã o estará esperando. A sociedade moderna se afasta sempre mais de Deus, de sua autoridade, de sua lembrança.. Não está Deus nos acompanhando enquanto o vamos perdendo de vista?

Logo o filho se instala numa "vida desordenada", O termo original não sugere apenas uma desordem moral, mas uma existência insana, descontrolada, caótica. Em pouco tempo sua aventura começa a transformar-se em drama. Sobrevém uma "fome terrível" e ele só sobrevive cuidando de porcos, como escravo de um estranho. Suas palavras revelam sua tragédia: "Eu aqui morro de fome"

O vazio interior e a fome de amor podem ser os primeiros sinais de nosso afastamento de Deus. Não é fácil o caminho da liberdade. O que nos falta? O que poderia encher o nosso coração? Temos quase tudo, então por que sentimos tanta fome?

O jovem "entrou em si mesmo" e, aprofundando-se em seu próprio vazio, recordou o rosto de seu pai, associado à abundância de pão: na casa de meu pai eles "têm pão" e aqui "eu morro de fome". Em seu interior desperta o desejo de uma liberdade nova junto a seu pai. Ele reconhece seu erro e toma uma decisão: "Pôr-me-ei a caminho e irei procurar meu pai".

Pôr-nos-emos a caminho para Deus, nosso Pai? Muitos o fariam se conhecessem este Deus que, segundo a parábola de Jesus, "sai correndo ao encontro do filho, lança-se ao seu pescoço e põe-se a beijá-lo efusivamente". Estes abraços e beijos falam de seu amor melhor que todos os livros de teologia. Junto a ele sempre poderemos encontrar uma liberdade mais digna e feliz.






quinta-feira, março 24, 2022

O SOFRIMENTO E A DOR






Este tempo quaresmal, cujo ápice será a celebração da vitória pascal de Cristo sobre o mal e a morte, faz-nos refletir sobre o sofrimento em nossa vida, o mal e a dor que sempre estão presentes em nossa existência. Por que o mal? Deus não é nosso Pai? Por que permite que soframos? É a grande questão da humanidade em toda a sua história: a existência do mal.

O Catecismo da Igreja Católica nos diz que a resposta não pode ser dada de modo rápido e simples, mas há que se considerar todo o conjunto da fé cristã: a bondade da criação, as sábias leis divinas da natureza, a pequenez e limitação da criatura (só Deus é perfeitíssimo, sem deficiências; as criaturas, não),  a liberdade humana, o drama do pecado, o amor paciente de Deus, a sabedoria misteriosa da Providência divina, enfim, todo o conjunto da mensagem cristã traz a solução para o problema do mal.

Em sua sabedoria e bondade infinitas, Deus quis criar um mundo em estado de busca da perfeição última. Essa série de transformações que se operam no universo permite, no desígnio de Deus, juntamente com o mais perfeito, também o imperfeito, com as construções da natureza, também as destruições. Juntamente com o bem físico existe, portanto, o mal físico, enquanto a criação não houver atingido a sua perfeição. As leis físicas e químicas universais, criadas por Deus, são benéficas universalmente, embora, pela deficiência das criaturas, por serem tais, possam produzir alguns malefícios particulares, a não ser que Deus interfira com um milagre, que é a suspensão temporária do efeito das suas leis universais da natureza, o que só raramente acontece, por motivos só dele conhecidos.

Além disso, existe o mal moral, procedente da vontade livre do homem, pelo mau uso da liberdade que Deus lhe deu para poder merecer agindo sem coação. 

E Deus sempre sabe tirar do mal um bem. “Deus todo-poderoso, por ser soberanamente bom, nunca deixaria qualquer mal existir em suas obras se não fosse bastante poderoso e bom para fazer resultar o bem do próprio mal” (S. Agostinho, De libero arbítrio, I, 1, 2). E nós também devemos sempre tirar do mal um bem: a caridade, a solidariedade, o arrependimento, a contrição, o propósito de melhorarmos a nós e o mundo, a paciência, a humildade, o desapego, enfim as virtudes cristãs que nos preparam para uma eternidade feliz, sem males.

“Ao longo deste tempo, manteremos o olhar fixo sobre Jesus Cristo, ‘autor e consumador da fé’ (Hb 12, 2): n’Ele encontra plena realização toda a ânsia e aspiração do coração humano. A alegria do amor, a resposta ao drama da tribulação e do sofrimento, a força do perdão face à ofensa recebida e a vitória da vida sobre o vazio da morte, tudo isto encontra plena realização no mistério da sua Encarnação, do seu fazer-Se homem, do partilhar conosco a fragilidade humana para a transformar com a força da sua ressurreição. N’Ele, morto e ressuscitado para a nossa salvação, encontram plena luz os exemplos de fé que marcaram estes dois mil anos da nossa história de salvação” (Papa emérito Bento XVI, Porta Fidei, 13).


 Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan


segunda-feira, março 21, 2022

III DOMINGO DA QUARESMA








Como Jesus lê o jornal de cada dia? Como você acha que Jesus lê o jornal e ouve as notícias de cada dia? No tempo que Jesus esteve fisicamente entre nós, os jornalistas não escreviam as notícias no papel e nem as comunicavam pela rádio ou televisão; davam a notícia oralmente, contando o que tinha acontecido. É o que ouvimos no Evangelho; contaram a Jesus o assassinato de alguns galileus que, possivelmente, tinham provocado os soldados de Pilatos. Provocaram os soldados com violência e foram mortos violentamente. A violência produz violência e morte. Jesus não ouve as notícias para se revoltar, mas para propor a necessidade da conversão, a necessidade da mudança de mentalidade: deixar a mentalidade da violência, que produz morte, por uma proposta nova, capaz de produzir frutos como uma figueira que produz frutos doces e abundantes no decorrer do ano.

A conversão, repito, não acontece de um momento para o outro. Ao contrário, exige que seja cultivada como se cultiva uma planta, como se cultiva a figueira, diz Jesus. A comparação de Jesus mostra-nos que a vida cristã não é uma árvore ornamental, bonita no seu formato; é uma árvore que produz frutos e, para isso, existe a necessidade de ser cuidada, ser cultivada. O vinhateiro, aquele que cuida da figueira, é a Igreja.

OBS1 A conversão necessita ser aprendida com a pedagogia pastoral do cultivo da figueira, uma planta que duas vezes ao ano produz frutos abundantes e doces (E). Facilmente se compreende que Deus não espera uma religião de atividades exteriores — muito comum na Quaresma com propostas de sacrifícios em forma de renúncias pequenas — mas o esforço de cultivar uma nova mentalidade, adubada pelo Evangelho, que produza frutos deliciosos e abundantes em todas as épocas do ano.

OBS2 Do ponto de vista pastoral, percebe-se claramente a necessidade de educar o povo para a conversão, favorecendo a experiência espiritual de contato com Deus em vista de uma efetiva transformação existencial e, não apenas de algum hábito, como deixar de comer doce, por exemplo, durante a Quaresma. Quem se converte não estaciona num esforço particular, como não comer doce, para ficar no nosso exemplo, mas assume a consequência da conversão: a missão

O dono da figueira é Deus Pai, que vem buscar frutos na vida de cada um nós. Que frutos de conversão — de pensar e de agir como Deus — produzimos para Deus, para nossa família; produzimos aqui na comunidade? Jesus explica bem o trabalho da Igreja: não se cansar de propor a conversão. Isto é como cuidar de uma árvore: espera paciente, afofa a terra, coloca adubo, rega, ensina, educa na fé... mas tem uma coisa: a reação. Para se converter é preciso reagir e o modo de reagir é produzindo frutos de vida, de bondade, de paciência; frutos de amor fraterno. Isto acontece quando adubamos nossas vidas com o adubo do Evangelho. que fertiliza a vida para produzir frutos evangelizados. Amém!








quinta-feira, março 17, 2022

UM NOME COMUM ESPECIAL








UM NOME COMUM ESPECIAL

17 de março de 2022

 

 

Paróquia São Conrado



José é um nome hebraico, muito comum entre nós, cujo significado é “aumento, acréscimo, Deus dê aumento” (Gn 30,24). E que belo nome! Nome honrado, sobretudo por dois grandes personagens bíblicos: no Antigo Testamento, José, o grande provedor do Egito, vendido por seus irmãos e depois vice-rei, figura de Jesus Cristo, e no Novo, São José, esposo da Virgem Maria e pai adotivo de Jesus. O mês de março é a ele dedicado e sua festa, no próximo dia 19.

São José era de família nobre, a família real de Davi. Se a sua família ainda estivesse reinando, ele seria um príncipe. Mas a sua nobreza veio principalmente por ter sido escolhido para esposo e guarda da honra e virgindade daquela que viria a ser a mãe do Filho de Deus feito homem, Jesus.

Quando ele tinha apenas desposado Maria, primeira parte do casamento hebraico, mas antes de recebê-la em casa, ocorreu a Anunciação e a Encarnação do Filho de Deus. Maria objetou ao Anjo mensageiro a impossibilidade de ter um filho, pois “não conhecia varão” (Lc 1,34), isso apesar de ser noiva de José, o que claramente indica o seu voto de virgindade, de pleno conhecimento do seu futuro esposo. O Anjo, da parte de Deus, lhe garantiu que a concepção daquele filho não seria por obra humana, mas sim “por virtude do Espírito Santo” (Mt 1,18). O próprio José, em sonho, foi advertido pelo anjo do que ocorrera. E ele teria como missão ser o guarda daquela Virgem Mãe e pai nutrício daquele Filho, que era realmente o Filho de Deus. E Jesus lhe dava o nome de pai, sendo conhecido como “o filho do carpinteiro” (Mt 13,55), tido por todos “como sendo filho de José” (Lc 3,23).

São José protegeu a Sagrada Família, sobretudo na fuga para o Egito, quando da perseguição de Herodes ao Menino Jesus. Como chefe e protetor da Sagrada Família, ele se tornou o patrono de todas as famílias. E seu modelo de amor, humildade, paciência e obediência a Deus. “Do exemplo de São José chega a todos um forte convite a desenvolver com fidelidade, simplicidade e modéstia a tarefa que a Providência nos designou” (Bento XVI).

São José é também o padroeiro dos trabalhadores porque, como carpinteiro, sustentava a Sagrada Família com o seu suor e o trabalho de suas mãos. A festa de São José, como padroeiro dos trabalhadores, se comemora no dia 1º de maio, dia do trabalho.

Antigamente havia uma festa especial para honrar o Patrocínio de São José, ou seja, sua proteção, seu amparo. Daí o nome muito comum a pessoas e cidades, Patrocínio e José do Patrocínio, em honra do patrocínio de São José.

Tendo tido a mais bela das mortes, pois morreu assistido por Jesus, que ainda não tinha começado a sua vida pública, e por Maria Santíssima, São José é invocado como padroeiro dos moribundos e patrono da boa morte.

O Papa Pio IX proclamou São José patrono da Igreja, que é a família de Deus. Por tantos gloriosos motivos, São José faz jus à honra e à devoção especial que lhe tributamos.

 

 

Fonte:

Dom Fernando Arêas Rifan

http://domfernandorifan.blogspot.com.br/

segunda-feira, março 14, 2022

II DOMINGO DA QUARESMA




II DOMINGO DA QUARESMA

13 de março de 2022

 

Paróquia São Conrado



A transfiguração de Jesus é uma manifestação do belo, manifestação da beleza divina no rosto e nas vestes de Jesus. Diante de Jesus transfigurado pela beleza divina, Pedro, totalmente envolvido na e pela beleza de Deus em Jesus, tornou-se desejoso de ficar emergido na beleza divina para sempre; queria morar na beleza divina, fazendo referência à bondade: "Mestre, é bom estarmos aqui" (E).

A Palavra do 2DTQ-C está repleta de beleza, a começar pela contemplação do céu. Deus faz sua promessa a Abraão pedindo que contemple a beleza do céu estrelado (1L). A promessa divina não se configura unicamente na quantidade incontável de um céu estrelado, mas na qualidade do mesmo, caracterizado pela beleza iluminada das estrelas. Uma promessa assinada pela beleza da criação divina (cf. TB da CF2022, 216). É na beleza divina que procuramos e nos encontramos com o rosto divino (SR).

Beleza divina marcada pela luz que, em forma de “tocha de fogo” (teofania) (1L), passa no meio do sacrifício, o purifica e santifica. “O Senhor é minha luz”, canta o salmista (SR), luz da beleza purificadora e santificante.

Tudo que reluz, que brilha, tudo que ilumina manifesta beleza e atrai. Somos atraídos pela beleza porque a beleza toca o coração, tem a força de atingir o centro da vida, e isso é bom; enche o coração de bondade. O Texto Base da CF2022 (n. 214) diz que educar para o belo é educar para o transcendente, não se limitando “ao estômago” e, pior ainda, ao que é vergonhoso (2L). Paulo confronta-se com a limitação de muita gente, cristãos incluídos, incapazes de perceber a paradoxal beleza da Cruz de Jesus Cristo, refulgente com a beleza da bondade divina e a grandeza do seu amor.

É com esta disposição, de desejar que todos sejam atraídos pela beleza divina, que a Igreja propõe a educação pelo belo e a educação para a beleza. Educar para a beleza do Evangelho, educar para a beleza transfiguradora de entrar em contato com a divindade de Jesus, como aconteceu com Pedro, João Tiago, encontrando naquela experiência o desejo de permanecer eternamente envolvido pela bondade divina: "Mestre é bom estarmos aqui" (E).

Como Pedro, João e Tiago, os discípulos e discípulas de todos os tempos são convidados a deixar-se envolver na beleza divina e, possuídos pelo encantamento dessa beleza, não querer jamais abandonar o Tabor e ali permanecer para sempre. É um desejo saudável, próprio de quem tem coração contemplativo, de quem vai em busca da face de Deus (SR) e se envolve com a beleza divina, desejando estar com Deus eternamente.

É para essa beleza envolvente de Deus que somos convocados a nos educar nesta CF2022, para que o envolvimento com a beleza de Jesus, refletida especialmente no Evangelho, encante o mundo e transfigure vidas. A educação para a beleza do Evangelho acolhe o convite sempre necessário de Jesus para descer do Tabor (E) e encantar o mundo com a bondade e a verdade do Evangelho (Cf. TB da CF2022, n. 214).

A espiritualidade do 2DTQ-C convida os celebrantes a serem contemplativos da beleza divina. É uma espiritualidade dinâmica, inspirada na confissão do salmista como buscador da face divina. Para buscar Deus é preciso sair da tenda e contemplar a beleza do céu estrelado. É preciso deixar, ao menos por um tempo, a estrada cotidiana que conduz a Jerusalém, para se envolver no silêncio contemplativo do Tabor, onde Jesus se manifesta em toda sua beleza divina.

Essa celebração desperta a espiritualidade dos celebrantes para as coisas do alto, para a luz de Deus, para a transcendência (2L). É preciso acordar os olhos do coração para ser educado pela beleza divina transfigurando-se diante de nós. Sempre existe um brilho mais intenso, esplendente, encontrado por quem se dispõe a subir o Tabor para, na contemplação, buscar o rosto luminoso de Deus.

quinta-feira, março 10, 2022

A GUERRA E A PAZ






A GUERRA E A PAZ

10 de março de 2022

 

Paróquia São Conrado



O que a Igreja, no seu Catecismo, tem a nos dizer sobre a paz e a guerra?

“O respeito e o crescimento da vida humana exigem a paz. A paz não é só ausência da guerra, nem se limita a assegurar o equilíbrio das forças adversas...Ela é ‘tranquilidade da ordem’ (Santo Agostinho, em A Cidade de Deus); é ‘obra da justiça’ (Is 32, 17) e efeito da caridade (Gaudium et Spes, 78) (CIC 2304).

“O quinto mandamento proíbe a destruição voluntária da vida humana. Por causa dos males e injustiças que toda a guerra traz consigo, a Igreja exorta instantemente a todos para que orem e atuem para que a Bondade divina nos livre da antiga escravidão da guerra (Gaudium et Spes, 81). Cada cidadão e cada governante deve trabalhar no sentido de evitar as guerras. No entanto, enquanto subsistir o perigo de guerra e não houver uma autoridade internacional competente, dotada dos convenientes meios, não se pode negar aos governos, uma vez esgotados todos os recursos de negociações pacíficas, o direito de legítima defesa (Gaudium et Spes, 79)”.

“Devem ser ponderadas com rigor as estritas condições duma legítima defesa pela força das armas. A gravidade duma tal decisão submete-a a condições rigorosas de legitimidade moral. É necessário, ao mesmo tempo: – que o prejuízo causado pelo agressor à nação ou comunidade de nações seja duradouro, grave e certo; – que todos os outros meios de lhe pôr fim se tenham revelado impraticáveis ou ineficazes; – que estejam reunidas condições sérias de êxito;

– que o emprego das armas não traga consigo males e desordens mais graves do que o mal a eliminar. O poder dos meios modernos de destruição tem um peso gravíssimo na apreciação desta condição. Estes são os elementos tradicionalmente apontados na doutrina da chamada ‘guerra justa’. A apreciação destas condições de legitimidade moral pertence ao juízo prudencial daqueles que têm o encargo do bem comum” (CIC 2307-2309).

“A Igreja e a razão humana declaram a validade permanente da lei moral durante os conflitos armados. ‘Uma vez lamentavelmente começada a guerra, nem por isso tudo se torna lícito entre as partes beligerantes’ (Gaudium et Spes, 79). Devem ser respeitados e tratados com humanidade os não-combatentes, os soldados feridos e os prisioneiros. As ações deliberadamente contrárias ao direito dos povos e aos seus princípios universais, bem como as ordens que comandam tais ações, são crimes. Uma obediência cega não basta para desculpar os que a elas se submetem. Assim, o extermínio dum povo, duma nação ou duma minoria étnica deve ser condenado como pecado mortal. É-se moralmente obrigado a resistir às ordens para praticar um genocídio. ‘Toda a ação bélica, que tende indiscriminadamente à destruição de cidades inteiras ou vastas regiões com os seus habitantes, é um crime contra Deus e o próprio homem, que se deve condenar com firmeza, sem hesitação’ (Gaudium et Spes, 80). Um dos perigos da guerra moderna é o de oferecer aos detentores das armas científicas, nomeadamente atômicas, biológicas ou químicas, ocasião para cometer tais crimes” (CIC 2312-2314).

 

Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan

segunda-feira, março 07, 2022

I DOMINGO DA QUARESMA






A palavra educação de “ex+ducere”, em latim, significa conduzir num caminho. Por isso o deseducado é um errante; não tem um caminho onde caminhar. É claro que estou emprestando a figura do “errante” da 1ª leitura para propor minha reflexão. Quem é o errante? É alguém que não tem endereço certo; anda de um lado para outro, vagando de estrada em estrada, sem nunca chegar a lugar algum. Errante, em sentido existencial, é alguém que não sabe o que fazer da vida. Ora tenta uma estrada, ora outra, ora está de um jeito, ora de outro... vida errante; vive a procura de uma direção, que nem ele mesmo sabe onde quer chegar. Muitos de nós temos momentos errantes; não sabemos para onde ir. Por isso, a sugestão é ser educado POR Deus e ser educado PARA Deus.

A espiritualidade Bíblica não considera a tentação uma provocação ao mal permitida por Deus. Ao contrário, a tentação faz parte da pedagogia divina de educar, por isso, a tentação é considerada uma passagem necessária para a maturidade na fé. São Paulo garante que Deus jamais permite que a tentação seja superior às nossas forças, à nossa capacidade de resisti-la (1Cor 10,13). Neste mesmo tom, podemos entender a afirmação do salmista que nenhum mal e nenhuma desgraça chegará perto se caminhamos nos caminhos propostos por Deus. Estes caminhos propostos por Deus são os caminhos de quem é educado POR Deus. A 1ª leitura descreve a profissão de fé do povo judeu, a profissão de fé de um povo que foi educado por Deus, no deserto, e reconhece que Deus o conduziu para a liberdade. Nossas celebrações, como esta que estamos celebrando agora, deveriam manifestar a consciência de sermos um povo educado por Deus.

O povo educado por Deus, dizia a 1ª leitura, oferecia as ofertas ao sacerdote. E qual era o destino dessas ofertas? Não eram queimadas e nem ficavam com os sacerdotes. Eram oferecidas aos representantes de Deus: os pobres. Quem é educado por Deus partilha generosa e fraternalmente o que tem com os pobres. Quem é educado PARA Deus não cede à tentação de um relacionamento milagreiro com Deus, transformando pedras em pão e, muito menos cede à tentação da ganância para possuir todas as riquezas da terra ou ser aplaudido descendo triunfalmente segurado por anjos. Jesus era educado POR Deus e educado PARA Deus. Por isso, não tenta Deus; não cai nas tentações de ser educado pelo demônio, de ser educado pelos atrativos do mundo. Aqui temos a primeira tarefa quaresmal: diante dos momentos errantes que temos na vida, somos educados pelas tentações do mundo, ou somos educados por Deus e educados para Deus? Quem educa nossas vidas para que não seja vida errante? Amém!









quinta-feira, março 03, 2022

QUARTA-FEIRA DE CINZAS







Quando dedicamos tempo para interrogar o sentido da vida, damos um passo importante na qualidade existencial. A Quaresma oferece essa oportunidade de rever ou refazer o sentido da vida. É o tempo propício para fazer crescer o divino (a santidade) que existe em nossas vidas, condição inquestionável para um sentido existencial de qualidade. Quaresma é tempo de deserto, tempo de silêncio, do silêncio necessário para ouvir Deus. Não a escuta superficial, de quem já conhece todos os textos Bíblicos, mas a escuta atenta; aquela escuta de quem se deixa educar por Deus. 

Inspirados e iluminados pela Campanha da Fraternidade 2022, tematizada na educação, sugerimos refletir o início da Quaresma em dois movimentos, na celebração da Quarta-feira de Cinzas: educados por Deus e educados para Deus.

 

Educados por Deus

A educação é um processo de conversão, um permanente redirecionamento do olhar, a capacidade de sentir a necessidade de mudar o coração (1L), o local onde moram nossos desejos, sonhos e pensamentos. Num tempo que educa prometendo a riqueza e a fama com receitas de felicidade existencial, nós, cristãos, sentimos a necessidade de “olhar a vida com outros olhos para rasgar o coração” (1L) e ser educado por Deus.

O salmista (SR) entende bem o que significa ser educado por Deus, a começar pela necessária mudança do coração, o centro das decisões existenciais segundo a Bíblia: “criai em mim um coração que seja puro, dai-me de novo um espírito decidido” para que possa sentir a alegria da vida e do viver com um espírito generoso. Tendo o coração modelado no coração generoso de Deus.

Para ser educado por Deus é importante considerar a imagem que fazemos de Deus, porque Deus nos educa modelando nossos corações a partir do seu coração divino. O Deus da Bíblia não é um Deus castigador, vingativo de nossos pecados; ao contrário, é misericordioso, benigno, compassivo (1L), que merece nosso louvor e adoração (SR). Educados por Deus para sermos misericordiosos, perdoadores, acolhedores dos desafios da vida com a mesma generosidade do coração divino.

 

 Educados para Deus

Um modo bem original de se educar para Deus é ser cuidadoso para não escorregar na idolatria da própria imagem; “não praticar a justiça na frente dos homens, para ser visto” (E). Não viver para ser visto, mas dar sentido ao viver sendo generoso a ponto de a mão direita não saber o que faz a esquerda (E). A generosidade modela o coração de quem é educado por Deus e torna-se fruto de quem é educado para Deus, educado para conduzir sua vida nos caminhos divinos.

Ser educado para Deus tem a ver com a recompensa prometida por Jesus: ser visto por Deus, ser considerado por Deus (E). Não é um simples prêmio, mas é o resultado da capacidade de viver e amar como Deus ama. A recompensa de quem é educado para Deus manifesta-se na paz interior e na alegria divina tomando conta do coração, no sentido pleno da vida.

A nossa fé, tantas vezes, é como cinza; marcada pela inconsistência. Tantas vezes, nossa esperança é como cinza; leve e facilmente levada pelo vento. Nossas mãos cristãs são como cinza; sempre repletas de compromissos pessoais. O nosso mundo parece-se muito com a cinza: quanta poeira existencial. Nossa comunidade, em alguns momentos, parece-se com a cinza; vive dispersa em busca de resultados e sucessos que não deixam marcas e caminhos de quem educado por Deus e para Deus.

Rezemos pessoalmente e rezemos em comunidade, rezemos no silencio que marca este tempo forte da Quaresma, para que o caminho e o retiro dos quarenta dias abram espaços em nossos corações para docilmente sermos educados por Deus, caminhando na estrada de Jesus.



















CINZAS DE CONVERSÃO






CINZAS DE CONVERSÃO

2 de março de 2022

 

Paróquia São Conrado



As cinzas impostas sobre a cabeça dos fiéis neste dia fazem-nos refletir sobre a nossa criação por Deus, o nosso nada – “Lembra-te que és pó e em pó te hás de tornar” – a nossa humilde condição e igualdade com nossos irmãos, além do aspecto penitencial pelos nossos pecados. É o início da Quaresma, tempo de oração, penitência e caridade. 

A Igreja no Brasil, incentivando-nos a esses exercícios espirituais, convida-nos também a um gesto concreto na área social, através da Campanha da Fraternidade (CF). É claro que essa ação social não pode ocupar o lugar das obras espirituais e caritativas, nem se suplanta a elas, mas é o seu complemento. Assim, a Campanha da Fraternidade tem como finalidade unir as exigências da conversão e da oração a algum projeto social, na intenção de renovar a vida da Igreja e ajudar a transformar a sociedade, a partir de temas específicos, tratados sob a visão cristã, convocando os cristãos a uma maior participação nos sofrimentos de Cristo, vendo-o na pessoa do próximo, especialmente dos mais necessitados da nossa ajuda.  Muitas obras sociais da Igreja católica no Brasil são sustentadas pelas coletas feitas na Campanha da Fraternidade.

Os Papas sempre recomendaram a Campanha da Fraternidade: Na mensagem para a CF de 1979, São João Paulo II falava da necessidade de viver a Quaresma com ascese pessoal, mas sem esquecer da importância do doar-se: “Dar mostras dessa conversão ao amor de Deus com gestos concretos de amor ao próximo”. “Campanha da Fraternidade (...) tempo em que cada cristão é convidado a refletir de modo particular sobre as várias situações sociais do povo brasileiro que requerem maior fraternidade” (Bento XVI, 2007). “Alegro-me que, há mais de cinco décadas, a Igreja no Brasil realize, no período quaresmal, a Campanha da Fraternidade, anunciando a importância de não separar a conversão do serviço aos irmãos e irmãs, sobretudo os mais necessitados” (Papa Francisco, mensagem para a CF em 2020).

A Campanha da Fraternidade deste ano é sobre o importante tema da educação: “Fraternidade e Educação”, com o lema: “Fala com sabedoria, ensina com amor” (cf Pr 31,26). Esse tema da educação é lapidar. Educação na família e na escola. “Ser-se-á tudo ou nada, conforme a educação recebida” (Clemente XIV).

A Igreja sempre foi pioneira em matéria de educação. E no seu Direito Canônico, ela nos dá uma clara definição de educação: “Devendo a verdadeira educação ter por objetivo a formação integral da pessoa humana, orientada para o seu fim último e simultaneamente para o bem comum das sociedades, as crianças e os jovens sejam de tal modo formados que possam desenvolver harmonicamente os seus dotes físicos, morais e intelectuais, adquiram um sentido mais perfeito da responsabilidade e o reto uso da liberdade, e sejam preparados para participar ativamente na vida social” (Cânon 795).

Que os grandes santos educadores, como São João Bosco, São Marcelino Champagnat, São João Batista de la Salle, Santa Teresa de Jesus, intercedam por nós.

 

Fonte: Dom Fernando Arêas Rifan