A palavra
talento desta parábola que não é mais do que uma medida de peso que representa
30 kg de prata, fez tanto sucesso, que até já se emprega na linguagem popular
para designar as qualidades duma pessoa.
Porém, a parábola não exclui que os talentos que Deus nos deu não sejam somente as nossas possibilidades, mas também as nossas limitações. O que somos e o que temos, esse é o material com que Deus quer fazer de nós uma nova realidade.
Homilia de Padre
Marcos Belizário Ferreira no 33º Domingo do Tempo Comum – Ano A
A mensagem de Jesus é clara. Não ao conservadorismo , sim à
criatividade. Não a uma vida estéril, sim ao esforço arriscado por
transformar o mundo. Não à fé enterrada sob o conformismo, sim ao seguimento
comprometido de Jesus.
É muito tentador viver sempre evitando problemas e buscando
tranquilidade: não comprometer-nos em nada que possa complicar nossa vida,
defender nosso mesquinho bem-estar. Não há melhor forma de viver uma
vida estéril, pequena e sem horizonte.
Acontece o mesmo na vida cristã. Nosso maior
risco não é sairmos dos esquemas de sempre e cair em inovações, mas congelar
nossa fé e apagar o frescor do Evangelho. Temos de perguntar-nos o que estamos
semeando na sociedade, a quem transmitimos esperança, onde aliviamos
sofrimento.
Seria um erro
apresentar-nos diante de Deus com a atitude do terceiro servo: “Aqui tens o
que é teu . Aqui está teu Evangelho, o projeto de teu reino, tua mensagem de
amor aos que sofrem. Nós o conservamos fielmente. Não serviu para transformar
nossa vida, nem para introduzir teu reino no mundo. Não quisemos correr risco.
Mas aqui o tens intacto”.
A conduta desse
servo é estranha. Enquanto os outro servos se dedicam a fazer lucrar os bens
que o senhor lhes confiou, ao terceiro não lhe ocorre nada melhor do que
“esconder debaixo da terra”
o talento recebido para conservá-lo em segurança.
Quando o senhor chega, o condena como servo “negligente e preguiçoso” que não
entendeu nada. Como se explica este seu comportamento?
Esse servo não se sente identificado com seu senhor, nem com seus
interesses. Em
nenhum momento age movido pelo amor. Não ama seu senhor, só tem medo dele. E é
precisamente este medo que o leva a agir buscando sua própria segurança. Ele
mesmo explica tudo: “tive medo e fui esconder meu talento debaixo da terra”.
Esse servo não conhece o que é uma fidelidade ativa e criativa. Não
se compromete nos projetos de seu senhor. Quando este chega , lhe diz
claramente: “Aqui tens o que é teu”.
Parece que nesses momentos em que o cristianismo de muitas pessoas
chegou a um ponto em que o primordial é “conservar' e não tanto buscar com
coragem caminhos novos para acolher , viver e anunciar seu projeto do Reino de
Deus, temos de escutar atentamente a parábola de Jesus. Hoje Ele a diz para
nós.
Se nunca nos
sentimos chamados a seguir as exigências de Cristo além do ensinado e mandado
sempre; se não arriscamos nada para fazer uma Igreja mais fiel a Jesus; se nos
mantivermos alheios a qualquer conversão que possa complicar nossa vida; se não
assumirmos a responsabilidade do reino, como fez Jesus, buscando “vinho novo
em odres novos”, é que precisamos aprender a fidelidade ativa, criativa e
arriscada, à qual nos convida sua parábola.
O fato de não mudar nada não significa que estamos sendo fiéis a Deus.
Nossa
suposta fidelidade pode ocultar algo como rigidez, covardia, imobilismo,
comodidade e , em última análise, falta de fé na criatividade do Espírito
Santo. A verdadeira fidelidade a Deus não se vive a partir da passividade e da
inércia, mas a partir da vitalidade e do risco de quem trata de escutar hoje
seus chamados.
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