O
caminho da fé não é o caminho das evidências materiais, das provas palpáveis,
das demonstrações científicas; mas é um caminho que se percorre com o coração
aberto à revelação de Deus, pronto para acolher a experiência de Deus e da vida
nova que Ele quer oferecer. Foi esse o caminho que os discípulos percorreram.
No final desse caminho (que, como caminho pessoal, para uns demorou mais e para
outros demorou menos), eles experimentaram, sem margem para dúvidas, que Jesus
estava vivo, que caminhava com eles pelos caminhos da história e que continuava
a oferecer-lhes a vida de Deus. Eles começaram a percorrer esse caminho com
dúvidas e incertezas; mas fizeram a experiência de encontro com Cristo vivo e
chegaram à certeza da ressurreição. É essa certeza que os relatos da
ressurreição, na sua linguagem muito própria, procuram transmitir-nos.
Na
catequese de Lucas há elementos que importa pôr em relevo:
1.
Ao longo da sua caminhada de fé, os discípulos descobriram a presença de Jesus,
vivo e ressuscitado, no meio da sua comunidade. Perceberam que Ele continua a
ser o centro à volta do qual a comunidade se constrói e se articula. Entenderam
que Jesus derrama sobre a sua comunidade em marcha pela história a paz (o
"shalom" hebraico, no sentido de harmonia, serenidade, tranquilidade,
confiança, vida plena - verso 36).
2.
Esse Jesus, vivo e ressuscitado, é o filho de Deus que, após caminhar com os
homens, reentrou no mundo de Deus. O "espanto" e o "medo"
com que os discípulos acolhem Jesus são, no contexto bíblico, a reação normal e
habitual do homem diante da divindade (vers. 37). Jesus não é um homem
reanimado para a vida que levava antes, mas o Deus que reentrou definitivamente
na esfera divina.
3.
As dúvidas dos discípulos dão conta dessa dificuldade que eles sentiram em
percorrer o caminho da fé, até ao encontro pessoal com o Senhor ressuscitado. A
ressurreição não foi, para os discípulos, um fato imediatamente evidente, mas
uma caminhada de amadurecimento da própria fé, até chegar à experiência do
Senhor ressuscitado (vers. 38).
4.
Na catequese/descrição de Lucas, certos elementos mais "sensíveis" e
materiais (a insistência no "tocar" em Jesus para ver que Ele não era
um fantasma - são, antes de mais, uma
forma de ensinar que a experiência de encontro dos discípulos com Jesus
ressuscitado não foi uma ilusão ou um produto da imaginação, mas uma
experiência muito forte e marcante, quase palpável. São, ainda, uma forma de
dizer que esse Jesus que os discípulos encontraram, embora diferente e
irreconhecível, é o mesmo que tinha andado com eles pelos caminhos da
Palestina, anunciando-lhes e propondo-lhes a salvação de Deus. Finalmente,
Lucas ensina também, com estes elementos, que Jesus ressuscitado não está
ausente e distante, definitivamente longe do mundo em que os discípulos têm de
continuar a caminhar; mas Ele continua, a sentar-Se à mesa com os discípulos, a
estabelecer laços de familiaridade e de comunhão com eles, a partilhar os seus
sonhos, as suas lutas, as suas esperanças, as suas dificuldades, os seus
sofrimentos.
5. Jesus ressuscitado desvela aos discípulos o sentido profundo das Escrituras. A Escritura não só encontra em Jesus o seu cumprimento, mas também o seu intérprete. A comunidade de Jesus que caminha pela vida deve, continuamente, reunir-se à volta de Jesus ressuscitado para escutar a Palavra que alimenta e que dá sentido à sua caminhada histórica (vers. 44-46).
6.
Os discípulos, alimentados por essa Palavra, recebem de Jesus a missão de dar
testemunho diante de "todas as nações, começando por Jerusalém". O
anúncio dos discípulos terá como tema central a morte e ressurreição de Jesus,
o libertador anunciado por Deus desde sempre. A finalidade da missão da Igreja
de Jesus (os discípulos) é pregar o arrependimento e o perdão dos pecados a
todos os homens e mulheres, propondo-lhes a opção pela vida nova de Deus, pela
salvação, pela vida eterna (vers. 47-48).