O
sofrimento - sobretudo o sofrimento do inocente - é, talvez, o drama mais
inexplicável que atinge o homem ao longo da sua caminhada pela história. Que
razões há para o sofrimento de uma criança ou de uma pessoa boa e justa? Por que
é que algumas vidas estão marcadas por um sofrimento atroz e sem esperança?
Como é que um Deus bom, cheio de amor, preocupado com a felicidade dos seus
filhos, Se situa face ao drama do sofrimento humano? A única resposta honesta é
dizer que não temos uma resposta clara e definitiva para esta questão. O
"sábio" autor do livro de Jó lembra-nos, contudo, a nossa pequenez,
os nossos limites, a nossa finitude, a nossa incapacidade para entender os
mistérios de Deus e para compreender os caminhos por onde se desenrolam os projetos
de Deus. De uma coisa podemos estar certos: Deus ama-nos com amor de pai e de
mãe e quer conduzir-nos ao encontro da vida verdadeira e definitiva, da
felicidade sem fim... Talvez nem sempre sejamos capazes de entender os caminhos
de Deus e a sua lógica... Mas, mesmo quando as coisas não fazem sentido do
ponto de vista da nossa humana lógica, resta-nos confiar no amor e na bondade
do nosso Deus e entregarmo-nos confiadamente nas suas mãos.
Ao
longo do livro de Jó, multiplicam-se os desabafos magoados de um homem a quem o
sofrimento tornou duro, exigente, amargo, agressivo, inconformado, revoltado
até. No entanto, Deus nunca condena o seu amigo Jó pela violência das suas
palavras e das suas exigências... Deus sabe que as vicissitudes da vida podem
levar o homem ao desespero; por isso, entende o seu drama e não leva demasiado
a sério as suas expressões menos próprias e menos respeitosas. A atitude
compreensiva e tolerante de Deus convida-nos a uma atitude semelhante face aos
lamentos de revolta e de incompreensão vindos do coração daqueles irmãos que a
vida maltratou.
Jó
é, também, o crente honesto e livre, que não aceita certas imagens
pré-fabricadas de Deus, apresentadas pelos profissionais do sagrado. Recusa-se
a acreditar num Deus construído à imagem dos esquemas mentais do homem, que
funciona de acordo com a lógica humana da recompensa e do castigo, que Se
limita a fazer a contabilidade do bem e do mal do homem e a responder com a mesma
lógica. Com coragem, correndo o risco de não ser compreendido, Jó recusa esse
Deus e parte à procura do verdadeiro rosto de Deus - esse rosto que não se
descobre nos livros ou nas discussões teológicas abstratas, mas apenas no
encontro "face a face", na aventura da procura arriscada, na novidade
infinita do mistério. É esse mesmo percurso que Jó, o protótipo do verdadeiro
crente, nos convida a percorrer.
As ações de Jesus em favor dos homens que o
Evangelho deste domingo nos apresenta mostram a eterna preocupação de Deus com
a vida e a felicidade dos seus filhos. O projeto de Deus para os homens e para
o mundo não é um projeto de morte, mas de vida; o objetivo de Deus é conduzir
os homens ao encontro desse mundo novo (o "Reino de Deus") de onde
estão ausentes o sofrimento, a maldição e a exclusão, e onde cada pessoa tem
acesso à vida verdadeira, à felicidade definitiva, à salvação. Talvez nem
sempre entendamos o sentido do sofrimento que nos espera em cada esquina da
vida; talvez nem sempre sejam claros, para nós, os caminhos por onde se
desenrolam os projetos de Deus... Mas Jesus veio garantir-nos absolutamente o
empenho de Deus na felicidade e na libertação do homem. Resta-nos confiar em
Deus e entregarmo-nos ao seu amor.