Seguir, acreditar, rezar: eis os passos simples e seguros que sustentam a nossa estrada ao longo do Caminho da Cruz e nos deixam vislumbrar, gradualmente, o caminho da Verdade e da Vida.
“Se alguém contemplasse de longe a sua pátria mas de permeio estivesse o mar, veria aonde chegar, mas não disporia dos meios para ir até lá. O mesmo se passa conosco… Vislumbramos a meta a alcançar, mas de permeio está o mar do século presente…
Ora, a fim de que pudéssemos dispor também dos meios para lá chegar, veio de lá Aquele para quem nós queríamos ir… e forneceu-nos o madeiro com o qual atravessar o mar. De fato, ninguém pode atravessar o mar do século presente, se não é levado pela cruz de Cristo… Não abandones a cruz, e a cruz te levará”.
Estas palavras de Santo Agostinho, tiradas do seu Comentário ao Evangelho de João (2, 2), introduzem-nos na oração da Via-Sacra.
De fato, a Via-Sacra quer estimular em nós este gesto de nos agarrarmos ao madeiro da Cruz de Cristo ao longo do mar da vida.
Por isso, a Via-Sacra não é uma simples prática de devoção popular com caráter sentimental; mas exprime a essência da experiência cristã: “Se alguém quiser vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me” (Mc 8, 34).
No início de cada estação, depois da habitual enunciação, aparece uma frase muito breve que pretende oferecer a chave de leitura da respectiva estação.
Idealmente podemos recebê-la como que vinda de uma criança, numa espécie de apelo à simplicidade dos pequeninos que sabem captar o coração da realidade e num espaço simbólico de acolhimento, na oração de Igreja, da voz da infância por vezes ofendida e explorada.
A Palavra de Deus, que será proclamada, é tirada do Evangelho de João, à exceção das estações sem texto evangélico de referência ou que o têm noutros evangelhos. Com esta escolha, pretendeu-se evidenciar a mensagem de glória da Cruz de Jesus.
A oração dirigida ao “Humilde Jesus” – expressão cara ao coração de Agostinho (Conf. 7, 18, 24) –, que deixa cair o adjetivo humilde na crucifixão-exaltação de Cristo, é a confissão que a Igreja-Esposa dirige ao Esposo que a redimiu com o seu Sangue.
Segue-se uma invocação ao Espírito Santo, que guia os nossos passos e que derrama no nosso coração o amor divino (cf. Rm 5, 5): é a Igreja apostólico-petrina que bate à porta do coração de Deus.
Cada uma das estações individualiza uma pegada particular deixada por Jesus ao longo do Caminho da Cruz, que o crente é chamado a copiar. Assim os passos que marcam o caminho da Via-Sacra são: verdade, honestidade, humildade, oração, obediência, liberdade, paciência, conversão, perseverança, essencialidade, realeza, dom de si mesmo, maternidade, expectativa silenciosa.
Meditando em Jesus sozinho na sua Paixão, que atravessa a terra deserta nela escavando um sulco e regando-o com a sua graça. Um raio de luz, sempre presente e colocado de modo a formar uma cruz, indica o olhar do Pai, enquanto a sombra de uma pomba, o Espírito Santo, recorda que Cristo, “pelo Espírito eterno, Se ofereceu a Si mesmo a Deus, sem mácula” (Heb 9, 14).
Senhor Jesus,
Vós nos convidais a seguir-Vos também
nesta vossa hora extrema. Em Vós, está cada um de nós e nós, apesar de muitos, somos Um só em Vós. Na vossa hora, está presente a hora da provação da nossa vida, nos seus aspectos mais crus e duros; está presente a hora da paixão da vossa Igreja e da humanidade inteira.
Está presente a hora das trevas: quando “tremem os fundamentos da terra” e o homem, “parcela da vossa criação” geme e sofre com ela; quando as várias máscaras da mentira ridicularizam a verdade e as lisonjas do sucesso sufocam o apelo íntimo da honestidade; quando o vazio de sentido e de valores anula a obra educativa e a desordem do coração desfigura a ingenuidade dos pequeninos e dos débeis; quando o homem perde o caminho que o leva ao Pai e já não reconhece em Vós o rosto belo da própria humanidade.
Nesta hora, insinua-se a tentação da fuga,
o sentimento da desolação e da angústia,
enquanto a traça da dúvida corrói a mente
e, como no palco, o pano da escuridão cai sobre a alma.
o sentimento da desolação e da angústia,
enquanto a traça da dúvida corrói a mente
e, como no palco, o pano da escuridão cai sobre a alma.
E Vós, Senhor, que ledes no livro aberto do nosso frágil coração, voltais a perguntar-nos nesta noite, como um dia aos Doze: “Também vós quereis ir embora?
Não, Senhor, não podemos nem queremos ir embora, porque só “Vós tendes palavras de vida eterna”. Só Vós sois “a palavra da verdade” e a vossa Cruz é a única “chave que nos abre aos segredos da verdade e da vida”.
“Nós Vos seguiremos para onde quer que fordes!”
Meditações da Ir. Maria Rita Piccione, O.S.A.
Presidente da Federação dos Mosteiros Agostinianos da Itália – “Nossa Senhora do Bom Conselho”
Imagens Anderson Afonso