sábado, dezembro 02, 2023

O CULTO DAS RELÍQUIAS

 



Os abusos provocaram a rejeição das relíquias por parte do protestantismo, ao que o Concílio de Trento respondeu nos seguintes termos:

 

“Ensinem os Bispos diligentemente que devem ser venerados pelos fiéis os sagrados corpos dos santos mártires e dos outros que vivem com Cristo, [corpos] que foram membros vivos de Cristo e templos do Espírito Santo (cf. 1Cor 3, 16; 6, 15.17.19; 2Cor 6,16) e que por Ele hão de ser ressuscitados para a vida eterna e glorificados e pelos quais concede Deus aos homens muitos benefícios. Por isso, aqueles que afirmam que às relíquias dos santos não se deve prestar veneração e honra, ou que elas e outros sagrados restos mortais são inutilmente venerados pelos  fiéis, ou que em vão se cultua a memória deles para lhes pedir ajuda: [aqueles que tais coisas afirmam] devem ser de todo condenados, como já antigamente os condenou e agora também os condena a Igreja” (Collantes, FC nº 7255).

 

Em 1587 o Papa Sixto V confiou o controle do culto das relíquias a chamada “Congregação dos Ritos”, que em 1969 o passou à Congregação para as Causas dos Santos.

 

Depois que um servo de Deus é beatificado, é lícito expor suas relíquias à veneração dos fiéis; até data recente também era permitido retirar parcelas dessas relíquias e distribuí-las a quem as desejasse. Tal prática atualmente é desaconselhada.

 

Mais importantes do que as relíquias dos Santos são aquelas que presumidamente dizem respeito ao Senhor Jesus. Algumas são conhecidas e veneradas desde o século IV; outras foram trazidas para o Ocidente pelos Cruzados no século XII (sem sólida documentação que as autenticasse). São as seguintes:

 

1) O lenho da Cruz de Cristo, a principal relíquia. Pode-se crer que em 348 havia em Jerusalém ao menos um grande fragmento da Santa Cruz, como atesta o Bispo local São Cirilo em suas Catequeses Batismais (4, 10; 10, 19; 13, 4): “Até a presente data pode ser visto entre nós… mas, em virtude dos extratos que a fé multiplicou, foi distribuído em pequenos fragmentos por toda a terra”.

 

É certo que Santa Helena, mão do Imperador Constantino, depositou um pedaço relativamente grande da Cruz em seu palácio Sessorianum, que veio a ser posteriormente a basílica da Santa Cruz em Roma. É desse fragmento grande que provavelmente se derivam os pedacinhos da Cruz existentes na basílica do Latrão e no Vaticano.

 

Em Paris o rei Qcldeberto mandou construir a basílica da Santa Cruz para acolher um fragmento da mesma, local hoje dito “Saint Germain-des-Prés”. Pouco depois Santa Radegunda recebia em Poitiers (França) a relíquia da Cruz que o Imperador bizantino Justino II lhe enviava (569).

 

2) Entre as outras relíquias da Paixão, algumas são atestadas desde os séculos V / VI, como o título da Cruz de Cristo, a coluna da flagelação, a coroa de espinhos e os cravos, que várias comunidades reivindicaram para si.

 

3) A Escada Santa ou escada do palácio de Pilatos em Jerusalém, acha-se perto da basílica do Latrão, mas é comprovadamente uma falsa relíquia.

 

4) Na basílica do Latrão em Roma encontra-se a presumida mesa da última Ceia do Senhor.

 

5) O Santo Sudário de Turim polariza toda a atenção outrora prestada a outros sudários visitados por peregrinos, como o de Cadoum (França). É tido como autêntico por pesquisadores de renome, mas tornou-se misterioso porque recentemente os estudiosos descobriram um segundo rosto no santo lençol. Com efeito, o Prof. Giulio Fanti, da Universidade de Pádua (Itália), acredita ter visto uma imagem fraca em fotografias de seu projeto e resolveu estudar mais a fundo o problema, sem deixar de professar, até novas descobertas, a genuinidade do Santo Sudário

 

6) O presépio de Jesus em Belém era conhecido pelos cristãos do século III, como testemunha Orígenes falecido em 250: ver Contra Celsum 1.31. A partir do século VII só existem fragmentos, dos quais os mais notáveis são os da basílica de Santa Maria Maior em Roma.

 

7) A Casa Santa, tida como transferida pelos anjos de Nazaré para Loreto (Itália) em 1298 é considerada espúria.

 

Passemos agora a uma

 

Conclusão

Como diz S. Agostinho, os corpos dos Santo são instrumentos dos quais se serve o Espírito Santo para realizar suas obras. Por isto os seus despojos mortais são honrados desde o início da Igreja. As Atas do Martírio de S. Policarpo (+ 156) referem que, após a morte do mártir entregue ao fogo perseguidores, os fiéis foram recolher as suas cinzas.

 

Esta reverência recomenda que os cadáveres sejam sepultados, seguindo o curso natural das coisas, e não cremados. Nos séculos XVIII a XX a Igreja se opôs formalmente à cremação, porque a Maçonaria a propugnava para afirmar que o cadáver humano é lixo e deve ser tratado como lixo; a partir de 1964 a Igreja aceita a incineração, porque razões de urbanismo, higiene, economia… a podem recomendar independentemente de qualquer concepção filosófica materialista. Está a critério de cada fiel católico escolher o destino a ser dado aos seus despojos mortais.

 

Os católicos veneram os Santo e suas relíquias, não os adoram. Há, porém, quem observe que segundo o Dicionário, venerar e adorar são a mesma coisa. Respondemos que venerar e adorar são duas atitudes íntimas ou da mente, que o Dicionário é incapaz de penetrar e qualificar. Com efeito, adorar não é simplesmente ajoelhar-se, mas é reconhecer no fundo do coração a soberania absoluta de um ser – o que só toca a Deus, o único Ser Absoluto. Venerar é reverenciar, respeitar, homenagear. O Brasil pára no dia 21 de abril não para adorar, mas para honrar e reverenciar Tiradentes. Não vale, pois, a palavra do Dicionário no caso.

 

A veneração das relíquias é algo tão natural e espontâneo que antecede  qualquer concepção mitológica ou cristã. Os pagãos podem praticá-la dentro de uma mentalidade politeísta; que lhes inspira o culto. Os cristãos a praticam dentro de uma mentalidade monoteísta; a estes será sempre necessário acautelar-se contra qualquer vestígio de superstição; ou magia, só Deus opera milagres… muitas vezes por intercessão dos Santos cujas relíquias são veneradas.

 

D. Estevão Bettencourt, OSB

 

Fonte: https://presbiteros.org.br/o-culto-das-reliquias/