Desde a tarde do primeiro domingo da Quaresma, o Papa e os seus mais
diretos colaboradores da Cúria Romana, estão a participar numa semana de
Exercícios Espirituais, na Casa Divino Mestre dos Padres Paulinos, em Ariccia.
Neste segundo
dia de Retiro Espiritual, o pregador carmelitano Padre Bruno Secondin, propôs
uma reflexão bíblica, baseada na leitura pastoral do profeta Elias.
"Retorne sobre os seus passos"
Terceira jornada dos Exercícios Espirituais da Quaresma, na casa Divino Mestre dos Paulinos.
O que fazes
aqui? O que procuras? Te deixas surpreender por Deus? Queres entender para onde
desejas ir? Então "recai em ti''. Começou com perguntas e convites dirigidos
diretamente ao coração dos presentes no quarto dia dos exercícios espirituais
quaresmais para o Papa e a Cúria romana.
O carmelita difundiu estas solicitações na primeira meditação de
quarta-feira 25 de Fevereiro que, depois das reflexões dedicadas a recuperar a
própria verdade interior e a liberdade de adesão à proposta de Deus, abriu ao
caminho rumo àquela proposta.
A contrastada
vicissitude do profeta Elias que se compromete com zelo e furor sagrado, mas
com um egocentrismo exasperado, para defender a aliança entre o Senhor e o seu
povo, e que se encontra exausto, derrotado e amedrontado numa caverna do monte
Oreb, continuou a inspirar as reflexões do pregador. Na meditação vespertina de
terça-feira 24, o religioso completou a proposta de "avaliação da consciência",
analisando precisamente a trágica situação de Elias que, como narra o capítulo
19 do primeiro livro dos Reis, que se encontra num estado de "depressão
mortal", amedrontado, em fuga, sozinho, exausto, desiludido com a própria
falência.
Um estado de
depressão, disse o padre Secondin, que "não é raro, até na vida sacerdotal.
Muitos cedem, também entre os sacerdotes". Portanto, é preciso prestar atenção
a determinados sinais que poderiam transformar-se em enormes dificuldades
interiores. Antes de tudo o "medo''. Emerge quando tememos o futuro, assumir as
responsabilidades. E pode estar acompanhado pela ''solidão'', por se sentir
excluído ou diverso, pelo sentido de ''vazio'' dado por uma vida árida,
desiludida pelos insucessos, pelo ''colapso psicofísico'' e pela ''auto-acusação'' (o próprio Elias diz: ''não sou melhor que os meus pais'').
Tudo isto pode acabar
na ''fuga'' – podendo esta ser física ou imaginária – ou na repetição obsessiva
de determinados gestos (como consumir álcool e comida ou as evasões no mundo
virtual), ou até no ''desejo de morrer''.
Para evitar tudo
isto é importante levar uma vida na qual ''a relação entre trabalho, repouso,
oração e relacionamentos sociais'' seja ''bem equilibrada''.
Reconhecer
quanto antes certas dinâmicas interiores, ''sinais de stress'', é fundamental
para poder encontrar a solução que é enunciada na narração bíblica através da
intervenção do anjo que conforta Elias e o convida a ir para o Oreb.
''Elias –
explicou o carmelita – precipitado no inferno, conhece a transformação da fuga
receosa que se torna peregrinação''. E nós, perguntou, na dificuldade ''sabemos
reconhecer ao nosso redor a mão do anjo?''. Assim como o pão foi sustento para
Elias, ''reconhecemos nós na Eucaristia o viático que nos acompanha?''. Assim
como a viagem levou Elias às raízes da aliança, também nós sabemos ''voltar às
raízes'' da nossa fé?
Quando a verdade
abre caminho no nosso íntimo e nos predispomos para a escuta, podemos alcançar
o confronto com Deus. E a ''manifestação misteriosa'' da qual fez experiência
Elias no Oreb, o ''sussurro de uma brisa leve'' sobre o qual tantos exegetas
refletiram, pode sugerir muito à meditação pessoal.
O padre
Secondin, na meditação da manhã de quarta-feira, repercorreu pormenorizadamente
o diálogo entre Deus e Elias. O profeta é caracterizado por um ''eu
hipertrófico'' que o leva a considerar-se o ''umbigo do mundo'': nesta ótica, ''a
sua derrota poderia parecer a derrota de Deus''. O Senhor ''deixa-o falar no seu
solilóquio hipertrófico'', quer que Elias ''se deixa decompor'' e realize uma
''catarse profunda''. Surpreende-o com a pergunta: ''O que fazes aqui?''. Deus
''apresenta-se com uma pergunta'' e obriga o homem a ''olhar para dentro de si, a
dar voz às inquietações que traz em si''.
Às vezes,
advertiu o pregador, também para nós Deus torna-se uma espécie de ''ornamento'';
e corremos o risco de ''o manipular'' com a mesma fúria que parece penetrar o
profeta. Mas ''Deus é livre diante dos poderosos e também da fúria de Elias'': a
falência de Elias não perturba Deus, que já tem o seu desígnio e um povo que
lhe permaneceu fiel.
Elias sente-se
abalado. O vento impetuoso, o terremoto, o fogo no qual o profeta não encontra
Deus poderiam ser – supôs o padre Secondin – ''projeções de estados interiores'' de uma pessoa que sente que o mundo inteiro lhe caiu em cima.
Desta lectio,
explicou o pregador, devem brotar algumas perguntas pessoais: ''Também nós temos
alguma Jezabel que nos arruína a vida? Estamos obcecados por problemas com
outras pessoas, ou de trabalho, de carreira?'', Como nos relacionamos com Deus?
Sabemos ''permanecer em adoração temente a Deus que passa?''. Dado que o Senhor é
intimidade, ''temos o hábito de estar com ele na intimidade?''. Ou há vozes
ensurdecedoras (''sucesso, vaidade, dinheiro, culpas dos outros'') que nos
distraem? Enfim – recordando os sete mil israelitas que permaneceram fiéis ao
Senhor – damo-nos conta de que podem representar ''a fidelidade silenciosa de um
povo?''
E quem medita deve também perguntar-se: sou capaz de compreender e
interceptar esta fidelidade, sou capaz de ouvir ''os ultrassons dos pobres, dos
simples, dos pequeninos'', que são ''dons preciosos e não fragmentos perdidos?''.
As respostas
podem encontrar um apoio na reação de Deus na narração bíblica. Elias queria
acabar ali, morrer no monte Oreb, onde a aliança tinha tido início; mas Deus ''manda-o
de novo para uma nova estação''. Também nós somos chamados a ''ver sinais de
futuro'' nas nossas raízes, a ''reencontrar vigor'', a pôr-nos a caminho. E se,
como Elias, ''nos sentimos desiludidos, cansados, acreditamos que somos os
melhores de todos e pensamos que o mundo é habitado só por demônios
desenfreados'', deixemo-nos ''surpreender por Deus'' e iniciemos um caminho novo.
Eis o convite
com o qual o pregador concluiu a meditação: ''Recai em ti!''. Uma exortação que o
padre Secondin enriqueceu com uma série de sugestões concretas, convidando a
partilhar os próprios bens materiais com os mais pobres, a ''abrir os armários
cheios de paludamentos inúteis'' e deitá-los fora, a abrir os braços para ''se
reconciliar sinceramente com quem não suportamos'', e abrir os horizontes ''para
a verdade polifônica, a beleza das culturas e a riqueza das tradições'' para
admirar o que Deus criou de bom.
Enfim, o
carmelita exortou: ''Dá passos rumo às periferias, vai celebrar nas barracas,
almoçar com quem tem pouco para comer.
Entenderás onde Deus te espera''.
L'osservatoreromano
- Roma, 25 de Fevereiro de 2015