Poucas frases são tão
provocativas como as que ouvimos hoje no Evangelho: “Se o grão de trigo não
cair na terra e não morrer, permanecerá infecundo; mas se morrer, produzirá
muito fruto”. O pensamento de Jesus é claro. Não se pode gerar vida sem dar a própria.
Não se pode fazer viver os outros se nós mesmos não estamos dispostos a
“desviver” pelos outros. A vida é fruto do amor e brota na medida em que
sabemos entregar-nos.
Há um sofrimento inevitável,
reflexo de nossa condição de criaturas, e que nos faz ver a distância que ainda
existe entre o que somos e o que somos a ser chamados a ser. Mas há também um
sofrimento com o qual as pessoas se ferem mutuamente.
É natural que nos afastemos da
dor, que busquemos evitá-la sempre que seja possível. Que lutemos para
suprimi-la de nós. Mas precisamente por isso há um sofrimento que é necessário
assumir na vida: o sofrimento aceito como preço de nosso esforço para fazê-lo
desaparecer de nossos semelhantes. “A dor só é boa se leva adiante o processo
de sua superação”.
É claro que na vida poderíamos
evitar muitos sofrimentos, amarguras e dissabores. Bastaria fechar os olhos
diante dos sofrimentos alheios e encerra-nos na busca egoísta de nossa
felicidade. Mas isto sempre seria um preço alto demais: deixando simplesmente
de amar.
Quando alguém ama e vive
intensamente a vida, não pode viver indiferente ao sofrimento grande ou pequeno
das pessoas. Quem ama se torna vulnerável. Amar os outros inclui sofrimento,
“compaixão”, solidariedade na dor. “Não existe nenhum sofrimento que possa
ser-nos alheio”. Esta solidariedade dolorosa faz surgir salvação e libertação
para o ser humano. É o que descobrimos no Crucificado: salva quem compartilha a
dor e se solidariza com o que sofre.
Nossos ouvidos não estão habituados
a ouvir palavras como estas de Jesus: “se o grão de trigo não cair na terra e
não morrer, permanecerá infecundo; mas se morrer produzirá fruto.” Nós pensamos
que é só a saúde, a força, o trabalho, isto é, o que nos sai bem, que pode
construir positivamente nossa vida. O que podem trazer de bom e positivo à
nossa vida a enfermidade, o sofrimento, a desgraça ou o fracasso?
Pensemos, por exemplo, nessa
experiência dolorosa do doença que todos podemos sofrer, cedo ou tradem em
nossa própria carne. A enfermidade se nos apresenta como algo totalmente mau e
negativo, uma fatalidade absurda que lança por terra todos os nosso projetos.
Seja como for a enfermidade pode
ser uma experiência de crescimento e renovação, se o enfermo conseguir vivê-la
de maneira positiva. Eis a seguir algumas sugestões.
A doença grave abala nossa
segurança. Vivíamos tranquilos e sem problemas, e de repente nos vemos
obrigados a deixar o trabalho, parar nossa vida e permanecer no leito. Então
chegam as perguntas: por que acontece isto justamente comigo? Será que vou
curar-me? Poderei voltar de novo à minha vida de sempre? A o adoecer, comprovamos que nossa vida é
frágil e está sempre ameaçada. Se estamos atentos, vamos ouvir que a
enfermidade nos convida a apoiar-nos em algo ou alguém mais forte e seguro que
nós.
Ao mesmo tempo, nas longas horas
de silêncio e dor, o enfermo começa a reviver lembranças prazerosas e
experiências negativas, desejos insatisfeitos, erros e pecados. E surgem de
novo as perguntas: Isto foi tudo? Para que vivi até agora? Que sentido tem
viver assim? É o momento de reconciliar-se consigo mesmo e com Deus, confessor
os erros do passado e acolher em nós a paz e o perdão.
Ao caírem tantas falsas ilusões,
o doente começa a descobrir o que é verdadeiramente importante na vida, o que
não quisera perder nunca: o amor às pessoas, a liberdade, a paz do coração, a
esperança. É o momento de reorientar nossa vida de maneira mais humana, intuímos
o que será melhor para nós.
Passarão os dias e as noites. O organismo
vai cura-se ou, talvez, cairá num processo incurável. Mas, seguindo-a Cristo,
muitas pessoas poderão descobrir que o grão que more dá fruto, O sofrimento
purifica e a enfermidade pode levar a uma vida mais saudável.
Cf. José Antonio Pagola