A
vida do crente é visitada por Deus. Ele habita no mais íntimo do coração de
cada um. É, na verdade, o doce hóspede da alma. Como é possível viver
distraídos, fora de si, com um tão grande hóspede na alma?
Mas
o evangelho também nos leva ao realismo. O amor do cristão não paira nas
nuvens. É um amor muito concreto: «Quem recebe os meus mandamentos e os observa
esse é que me tem amor» (v. 21). O amor que Jesus espera de nós não se
manifesta em palavras ou sentimentos vagos mas na vontade de amarmos a sua
vontade. Assim foi o seu amor pelo Pai. Sem união de vontades não há verdadeiro
amor. Quem ama a Jesus, ama cumprir a sua vontade. E quem ama a Jesus,
cumprindo a sua vontade, é amado pelo Pai, que quer a glorificação do Filho.
«Se
alguém me tem amor, há-de guardar a minha palavra; e o meu Pai o amará, e Nós
viremos a ele e nele faremos morada». (Jo 14, 23). Quantas vezes, procuramos a
Deus fora de nós ou acima de nós. Mas Deus está dentro de nós: «mais íntimo do
que o meu íntimo…», como afirma Santo Agostinho (Confissões 3.6.11). Realiza-se
deste modo a palavra de S. Paulo: «Cristo habite pela fé, nos vossos corações
de sorte que, enraizados e fundados no amor, possais compreender… qual é a
largura e o comprimento, a altura e a profundidade e conhecer (fazer a
experiência), enfim, o amor de Cristo que excede todo o conhecimento, para
serdes repletos da plenitude de Deus» (Ef 3,17-19).
Experimentar
o mistério de Cristo no mais íntimo de nós mesmos, no eu profundo, no “coração”
entendido biblicamente”. O “coração” é o lugar teológico da verdadeira oração,
do encontro de amor com Cristo.
Palavras de São João Paulo II em 1982 :
Grande
Sacramento é a Santa Crisma, muito importante no quadro geral da vida cristã,
iniciada no ato do Santo Batismo; é um sacramento muito rico por espiritual
significado e virtude. Dizer dom do Espírito, de facto, significa dizer
simultaneamente os dons do Espírito: os seus sete admiráveis dons que
acompanham a graça divina, inundando a alma de luz, de força e de coragem.
Recordais o que aprendestes no curso de catecismo? Sabedoria, inteligência,
conselho, fortaleza...: é, portanto, um dom que se multiplica e se ramifica em
tantos dons, que fazem de quem os recebe um perfeito cristão. Como os Apóstolos
que, depois de terem recebido o Espírito de verdade e de consolação a eles
prometido por Jesus ao término da última Ceia (cf. Jo 14, 16-17.26; 16, 7-14),
foram capazes de superar os limites da humana debilidade para se tornarem
intrépidos anunciadores e pregadores do Evangelho no mundo, assim também vós, e
sobretudo vós, queridos irmãos e irmãs, recebendo neste dia o mesmo Espírito,
todos podemos e devemos ser perfeitos cristãos, dispostos sempre e em tudo, com
a palavra e com as obras, a testemunhar Cristo na sociedade de hoje.
Tornados
filhos de Deus por força do Santo Baptismo, chegados por meio dele à luz da fé,
em nós a efusão do Espírito recebida na Confirmação vem para iluminar mais
amplamente este panorama, abrindo as nossas almas para uma visão mais clara e
profunda: com a Crisma, numa palavra, além do aumento da graça santificante
obtemos maior luz e somos chamados a maior responsabilidade. Por isso é comum
dizer-se que ela nos faz perfeitos cristãos. Sermos perfeitos cristãos
significa dar espaço à nossa fé, significa viver verdadeiramente o dia-a-dia da
nossa existência, como filhos da luz.
Precisamente
este ideal do "crescimento" da fé como intensificação de luz, desejo
hoje propor-vos. Na nossa época, mais que no passado, há maior necessidade de
fé para sermos testemunhas de Cristo no mundo secularizado. Procedei portanto
de modo que o estado de perfeitos cristãos em que vos constituí a Crisma, toque
profundamente a vossa alma e nela encontre correspondência numa autêntica vida
de fé; procedei de modo que à posição objetiva sacramental se alinhe, sem
separações nem contradições, a posição subjetiva existencial de cada um de vós.
O
dom do Espírito, como cada um dos Seus dons, não exime da resposta à vontade,
nem do esforço necessário para fazer que todos frutifiquem: o Senhor não
dispensa nunca o homem do esforço da correspondência e da colaboração. E se
entre estes dons se distingue — como quis recordar-vos — o de uma efusão mais
copiosa de luz sobrenatural, segue-se daí que mais decidida e mais firme deve
ser, por parte do homem, a resposta pessoal.
Com
este fim, para que isto se verifique em cada um de vós crismandos, desejo unir
às minhas palavras de incitamento a certeza de uma especial oração. Para vós
invoco eu o Espírito de Deus, para que se digne Ele mesmo confirmar do alto do
seu templo na Jerusalém celeste (cf. Sl 68, 29) aquilo que está para realizar
com a virtude do Seu sacramento. Assim seja.