sexta-feira, novembro 30, 2012

LAICIDADE E LAICISMO


por Dom Fernando Arêas Rifan*
A festa de Cristo Rei, há pouco celebrada, foi instituída pelo Papa Pio XI. O Reino de Jesus Cristo, “que não terá fim” (Credo de Nicéia), se manifesta na mesma pessoa de Cristo (Lumen Gentium, 5), e foi confiado por ele à sua Igreja, preparando-nos para a sua plena realização no Reino do Céu, quando Deus será tudo em todos (cf. 1 Cor 15, 28). Esta solenidade foi instituída especialmente como remédio contra o laicismo (Pio XI, Encíclica Quas Primas, 15), tema que sempre volta à ordem do dia.

Para a doutrina moral católica, o sadio laicismo ou laicidade, entendido como autonomia da esfera civil e política da religiosa e eclesiástica – mas não da moral – é um valor adquirido e reconhecido pela Igreja, no mundo atual. “No domínio próprio de cada uma, comunidade política e Igreja são independentes e autônomas” (Gaudium et Spes, 76). “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, explica Nosso Senhor (Mt 22,21). Mas esta independência dos poderes da Igreja e do Estado que não isenta a “César” do dever de dar a Deus o que é de Deus, da obrigação de seguir a Lei divina, natural e positiva.

Laicismo, porém, como é entendido hoje, seria uma autonomia da esfera civil em relação a Deus, à Lei Natural e à moral, equiparando-se assim ao indiferentismo e ao relativismo religioso, terminando no ateísmo prático e teórico: “uma economia sem Deus, um Direito sem Deus, uma política sem Deus” (Pio XII, Alocução de 12/10/1952).

“Graves perigos atuais, que penetram nas legislações e comportamentos: relativismo cultural, pluralismo ético, decadência e dissolução da razão e dos princípios da lei moral natural. Reivindica-se a autonomia para as escolhas morais. Leis que prescindem dos princípios da ética natural, deixando-se levar exclusivamente pela condescendência com certas orientações culturais ou morais transitórias, como se todas as concepções possíveis da vida tivessem o mesmo valor”.

“Tal concepção relativista do pluralismo nada tem a ver com a legítima liberdade dos cidadãos católicos de escolherem, entre as opiniões políticas compatíveis com a fé e a lei moral natural, a que, segundo o próprio critério, melhor se coaduna com as exigências do bem comum. A liberdade política não é nem pode ser fundada sobre a idéia relativista, segundo a qual, todas as concepções do bem do homem têm a mesma verdade e o mesmo valor”.

“Há que acrescentar que a consciência cristã bem formada não permite a ninguém favorecer, com o próprio voto, a atuação de um programa político ou de uma só lei, onde os conteúdos fundamentais da fé e da moral sejam subvertidos com a apresentação de propostas alternativas ou contrárias aos mesmos. Uma vez que a fé constitui como que uma unidade indivisível, não é lógico isolar um só dos seus conteúdos em prejuízo da totalidade da doutrina católica. Não basta o empenho político em favor de um aspecto isolado da doutrina social da Igreja para esgotar a responsabilidade pelo bem comum” (CDF, Nota Doutrinal sobre questões relativas à participação e comportamento dos católicos na vida política, de 24/11/2002).

*Bispo da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney