Uma das “Epifanias” ou manifestações divinas, que
celebramos no domingo passado, aconteceu no Batismo de Jesus, com a
descida, sobre Ele, do Divino Espírito Santo, em forma de pomba, e a voz do Pai
Eterno, apontando-o como seu filho amado e predileto. Jesus se manifestava
assim de modo especial aos judeus, como se tinha manifestado a todos em geral,
especialmente aos povos gentios, na pessoa dos Magos.
No Batismo de penitência, dado por João Batista, Jesus
se iguala aos pecadores, para nos dar exemplo de humildade.
“A Palavra de Deus,
que por amor assumiu a fragilidade e as contradições da condição humana, quis
descer até o fundo dessa situação assumindo sobre si até o pecado, para
reconciliar todos e tudo com Deus (cf. Cl 1,20), dando início em si mesmo ao
retorno do mundo à ordem e à paz original na submissão perfeita a Deus. “Aquele
que não conhecera o pecado, Deus o fez pecado por causa de nós, a fim de que,
por ele, nos tornemos justiça de Deus” (2 Cr 5,21). ‘Nas águas é lavado/ o
celestial cordeiro; / O que não tem pecado / nos lava em si primeiro’.
O
mergulhar de Jesus nas águas do rio Jordão desenvolve o processo da sua descida
na carne (Natal) e antecipa a sua conclusão no ‘batismo’ da sua Paixão e Morte
(Páscoa) (cf. Mc 10, 39), com a descida aos infernos, onde o crucificado, que
deu sua própria vida por amor, chama novamente Adão e Eva, as raízes simbólicas
da existência humana, à vida nova dos resgatados como filhos e filhas de Deus. “Depois
de ser batizado, Jesus saiu logo da água”. Com ele é o mundo inteiro que sai
das obscuridades do pecado e inicia um novo caminho” (Dom Emanuele Bargellini).
O Batismo dado por João Batista era um ritual de
penitência, não um sacramento, esse instituído depois por Nosso Senhor. Mas
essa comemoração é uma ocasião para refletirmos no nosso Batismo, o primeiro
sacramento que recebemos, pelo qual nos tornamos filhos de Deus, por adoção, e
membros da Igreja, incorporados ao Corpo Místico de Cristo, recebendo assim a
graça santificante, que nos eleva à ordem sobrenatural, tornando-nos
participantes da natureza divina.
Foi algo importantíssimo que marcou
definitivamente a nossa vida como cristãos.
Mas, infelizmente, muitos cristãos só ficam no seu
Batismo, não vivem mais na graça recebida nem a desenvolvem, não são coerentes
com o seu cristianismo. Como disse o Papa Bento XVI, “há muitos que são
batizados, mas não suficientemente evangelizados” (Verbum Domini, 96). Falta,
além do Batismo, a necessária conversão, ou seja, uma vida coerente com o
Batismo recebido. A consequência foi bem lembrada no Documento de Aparecida
(12): “Não resistiria aos embates do tempo uma fé católica reduzida a uma
bagagem, a um elenco de normas e proibições, a práticas de devoção
fragmentadas, a adesões seletivas e parciais das verdades da Fé, a uma
participação ocasional em alguns sacramentos, a moralismos brandos ou crispados
que não convertem a vida dos batizados... A todos nos toca recomeçar a partir
de Cristo”. Jesus, saindo das águas do Batismo, é o modelo para a nossa
conversão.
*Bispo da Administração Apostólica Pessoal
São João Maria Vianney