A
parábola do pastor que abandona noventa e nove ovelhas no deserto para ir à
procura de uma que se perdeu e que, chegado a casa, convoca os amigos e
vizinhos para celebrar o achamento da ovelha perdida, é uma parábola estranha,
se olharmos para ela com critérios de coerência e de lógica. Faz sentido
abandonar noventa e nove ovelhas por causa de uma? E faz sentido esse
espalhafato diante dos amigos e dos vizinhos, por causa de um fato tão banal
para um pastor como é o reencontrar uma ovelha que se extraviou do grupo? Ora,
são precisamente nesses exageros e nessas reações desproporcionadas que
transparece a mensagem essencial da parábola.
Não
há dúvida: Jesus deu-Se com gente duvidosa, com pessoas a quem os “justos”
preferiam evitar, com pessoas que eram anatematizadas e marginalizadas por
causa dos seus comportamentos escandalosos, atentatórios da moral pública.
Certamente não foram os discípulos a inventar para Jesus o injurioso apelativo
de “comilão e bêbedo, amigo de publicanos e de pecadores (Mt 11,19; cf.
15,1-2). Porque é que Jesus se dava com essas pessoas?
Porque,
na perspectiva de Lucas, Jesus é o amor de Deus que Se faz pessoa e que vem ao
encontro dos homens – de todos os homens – para os libertar da sua miséria e
para lhes apresentar essa realidade de vida nova que é o projeto do “Reino”. A
solicitude de Jesus para com os pecadores mostra-lhes que Deus os ama, que Deus
não os rejeita, que Deus os convida a fazer parte da sua família e a integrar a
comunidade do “Reino”. É que o projeto de salvação de Deus não é um condomínio
fechado, com seguranças fardados para evitar a entrada de indesejáveis; mas é
uma proposta universal, onde todos os homens e mulheres têm lugar, porque todos
– maus e bons – são filhos queridos e amados do Pai/Deus. A lógica de Deus é
sempre dominada pelo amor.
A
“parábola da ovelha perdida” pretende, precisamente, dar conta desta realidade.
A atitude desproporcionada de “deixar as noventa e nove ovelhas no deserto para
ir ao encontro da que estava perdida” sublinha a imensa preocupação de Deus por
cada homem que se afasta da comunidade da salvação e o “inqualificável” amor de
Deus por todos os homens que necessitam de libertação. O “pôr a ovelha aos
ombros” significa o cuidado e a solicitude de Deus, que trata com amor e com
cuidados de Pai os filhos feridos e magoados; a alegria desmesurada do “pastor”
significa a felicidade imensa de Deus sempre que o homem reentra no caminho da
felicidade e da vida plena.
Jesus
anuncia, aqui, a salvação de Deus oferecida aos pecadores, não porque estes se
tornaram dignos dela mediante as suas boas obras, mas porque o próprio Deus Se
solidariza com os excluídos e marginalizados e lhes oferece a salvação.
Encontramos aqui o cumprimento da profecia de Ezequiel que nos foi apresentada
na primeira leitura: Deus vai assumir-Se (através de Jesus) como o Bom Pastor,
que cuidará com amor de todas as ovelhas e, de forma especial, das
desencaminhadas e perdidas.