Hoje dia 21 de setembro, o Papa Francisco deixou Havana e foi à Holguín, onde celebrou na Praça da Revolução e abençoou a cidade. Em seguida, partiu para Santiago e se encontrou com os bispos no Seminário São Basílio Magno. Depois, Francisco foi ao Santuário da Virgem da Caridade do Cobre, padroeira do país, e rezou com os bispos e o séquito papal.
Celebramos a festa do apóstolo e evangelista Mateus. Celebramos a história duma conversão.
Ele próprio nos conta, no seu Evangelho, como foi o encontro que marcou a sua vida, introduzindo-nos numa «troca de olhares» que pode transformar a história.
Um dia, como outro qualquer, estava ele sentado no posto de cobrança de impostos, quando Jesus passou, viu-o, aproximou-Se e disse-lhe: «Segue-me». E ele, levantando-se, seguiu-O.
Jesus olhou para ele. Que força de amor teve o olhar de Jesus para mover assim Mateus! Que força deviam ter aqueles olhos para o levantar! Sabemos que Mateus era um publicano, ou seja, cobrava os impostos dos judeus para os entregar aos romanos. Os publicanos eram malvistos, até considerados pecadores, e por isso viviam separados e eram desprezados pelos outros. Com eles, não se podia comer, falar nem rezar.
Eram considerados pelo povo como traidores: tiravam da sua gente para dar aos outros. Os publicanos pertenciam a esta categoria social.
E Jesus parou, não passou ao largo acelerando o passo, olhou-o sem pressa, olhou-o com calma. Olhou-o com olhos de misericórdia; olhou-o como ninguém o fizera antes. E aquele olhar abriu o seu coração, fê-lo livre, curou-o, deu-lhe uma esperança, uma nova vida, como a Zaqueu, a Bartimeu, a Maria Madalena, a Pedro e também a cada um de nós. Mesmo quando não ousamos levantar os olhos para o Senhor, o primeiro a olhar-nos é sempre Ele. É a nossa história pessoal; tal como muitos outros, cada um de nós pode dizer: eu também sou um pecador, sobre quem Jesus pousou o seu olhar.
Convido-vos a que hoje, em vossas casas ou na igreja, quando estiverdes tranquilos, sozinhos, façais um tempo de silêncio recordando, com gratidão e alegria, as circunstâncias, o momento em que o olhar misericordioso de Deus pousou sobre a nossa vida.
O seu amor precede-nos, o seu olhar antecipa-se à nossa necessidade. Jesus sabe ver para além das aparências, para além do pecado, para além do fracasso ou da nossa indignidade. Sabe ver para além da categoria social a que possamos pertencer. Ele vê para além de tudo isso. Ele vê a dignidade de filho que todos temos, talvez manchada pelo pecado, mas sempre presente no fundo da nossa alma. É a nossa dignidade de filhos. Veio precisamente à procura de todos aqueles que se sentem indignos de Deus, indignos dos outros. Deixemo-nos olhar por Jesus, deixemos que o seu olhar percorra as nossas veredas, deixemos que o seu olhar nos devolva a alegria, a esperança, o gozo da vida.
Depois de olhá-lo com misericórdia, o Senhor disse a Mateus: «Segue-Me». E Mateus levantou-se e seguiu-O. Depois do olhar, a palavra. Depois do amor, a missão. Mateus já não é o mesmo; mudou intimamente. O encontro com Jesus, com o seu amor misericordioso, transformou-o. E para trás ficou a mesa dos impostos, o dinheiro, a sua exclusão. Antes, ele esperava sentado para arrecadar, para tirar aos outros; agora, com Jesus, tem de se levantar para dar, para entregar, para se dar aos outros. Jesus olhou-o, e Mateus encontrou a alegria no serviço.
Para Mateus e para quantos sentiram sobre si o olhar de Jesus, os compatriotas deixam de ser aqueles à custa de quem «se vive», usando e abusando deles. O olhar de Jesus gera uma atividade missionária, de serviço, de entrega.
Jesus vai à frente, precede-nos, abre o caminho e convida-nos a segui-Lo. Convida-nos a ir superando lentamente os nossos preconceitos, as nossas resistências à mudança dos outros e até de nós mesmos. Desafia-nos dia a dia com uma pergunta: Crês tu? Crês que é possível que um arrecadador de impostos se transforme num servidor? Crês que é possível um traidor transformar-se num amigo? Crês que é possível o filho de um carpinteiro ser o Filho de Deus? O seu olhar transforma os nossos olhares, o seu coração transforma o nosso coração. Deus é Pai que procura a salvação de todos os seus filhos.
Deixemo-nos olhar pelo Senhor na oração, na Eucaristia, na Confissão, nos nossos irmãos, especialmente naqueles que se sentem postos de lado, que se sentem mais sozinhos. E aprendamos a olhar como Ele nos olha. Partilhemos a sua ternura e misericórdia pelos doentes, os presos, os idosos e as famílias em dificuldade. Uma vez mais somos chamados a aprender de Jesus, que sempre olha o que há de mais autêntico em cada pessoa, isto é, a imagem de seu Pai.
Sei do grande esforço e sacrifício com que a Igreja em Cuba trabalha para levar a todos, mesmo nos lugares mais remotos, a palavra e a presença de Cristo. Menção especial merecem aqui as chamadas «casas de missão» que permitem a muitas pessoas, dada a escassez de templos e sacerdotes, ter um espaço para a oração, a escuta da Palavra, a catequese e a vida comunitária. São pequenos sinais da presença de Deus na nossa terra e uma ajuda diária para tornar vivas estas palavras do apóstolo Paulo: «Exorto-vos, pois, a que procedais de um modo digno do chamamento que recebestes; com toda a humildade e mansidão, com paciência: suportando-vos uns aos outros no amor, esforçando-vos por manter a unidade do Espírito, mediante o vínculo da paz» (Ef 4, 1-3).
Quero agora dirigir o olhar para Maria, Virgem da Caridade do Cobre, que Cuba acolheu nos seus braços abrindo-Lhe as suas portas para sempre, e a Ela peço-Lhe que mantenha, sobre todos e cada um dos filhos desta nobre nação, o seu olhar materno e que estes seus «olhos misericordiosos» velem sempre por cada um de vós, vossas casas, vossas famílias, pelas pessoas que possam sentir que não há lugar para elas. Que Ela nos guarde a todos, como guardou Jesus no seu amor. E que Ela nos ensine a olhar para os outros, como Jesus olhou para cada um de nós.
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